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É permitido a utilização de telemedicina/telessaúde para atestados médicos ocupacionais?

Autor: Emerson Climaco

Data de produção: 28/12/2023

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Recentemente foi suscitada uma questão interessante o qual merece atenção dos empregadores e empresas que prestam serviços ocupacionais: A telemedicina ou telessaúde pode ser utilizada para realizar atendimentos e Atestados Médicos Ocupacionais – ASO?

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Inicialmente temos que entender o contexto histórico para chegarmos a uma conclusão quanto ao tema.

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Havia dentro do Conselho Federal de Medicina – CFM uma ampla discussão quanto a possibilidade de utilização da telemedicina em território nacional, sendo que em 2018 foi estabelecida a Resolução CFM n.º 2.227/2018 definindo e disciplinando a telemedicina como forma de prestação de serviços médicos mediados por tecnologias. Contudo, esta foi revogada em 2019 pela Resolução CFM n.º 2.228/2019 por conta do alto número de opostas encaminhadas pelos médicos brasileiros para alteração dos termos da Resolução CFM n.º 2.227/2018, que define critérios para a prática da telemedicina no País, e ainda em atenção às solicitações das entidades médicas, que pediram mais tempo para analisar o documento e enviar também suas sugestões de alteração.

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No entanto, no início do ano de 2020 o nosso país, assim como o resto do mundo, foi assolado pela pandemia do covid-19, mudando completamente as rotinas pessoais e profissionais de todos por conta das restrições de contatos estabelecidas pelas organizações e normas de saúde.

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Tanto que por conta destas restrições, uma série de medidas legais foram emergencialmente editadas para mitigar os impactos das restrições impostas com a finalidade de diminuir o contágio do vírus naquele momento.

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Dentre elas o CFM editou um Ofício CFM nº 1756/2020-COJUR informando que decidiu em caráter de excepcionalidade e enquanto durasse a batalha de combate ao contágio da covid-19 a possibilidade e eticidade da utilização da telemedicina. Este parecer do referido conselho culminou na edição da Lei nº 13.989/2020 que autorizava o uso da telemedicina durante a crise causada pelo covid-19.

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Terminada as restrições impostas em combate ao covid-19, o CFM editou em abril de 2022 a Resolução CFM nº 2.314/2022 novamente definindo e regulamentando a telemedicina, como forma de serviços médicos mediados por tecnologias de comunicação.

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Em outubro de 2022 foi editada uma Resolução CFM nº 2.323/2022, que estabeleceu normas específicas para médicos que atendem o trabalhador. Dentre elas, restou estabelecido que:

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Art. 6º É vedado ao médico que presta assistência ao trabalhador:

I – Realizar exame médico ocupacional, com recursos de telemedicina, sem o exame presencial do trabalhador.

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Desta forma, temos que o CFM vedou aos médicos a realização de exame médico ocupacional com recurso de telemedicina, sendo necessário a realização destes de forma presencial.

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Contudo, em dezembro de 2022, foi editada a Lei nº 14.510/2022 que autoriza e disciplina a prática da telessaúde em todo o território nacional, mas nada é mencionado quanto a utilização deste método para exames médicos ocupacionais.

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Ressalte-se por oportuno e relevante que a Lei nº 14.510/2022 inclui um título novo na Lei nº 8.080/1990 que dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes. Nele ficou estabelecido que:

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Art. 26-D. Compete aos conselhos federais de fiscalização do exercício profissional a normatização ética relativa à prestação dos serviços previstos neste Título, aplicando-se os padrões normativos adotados para as modalidades de atendimento presencial, no que não colidirem com os preceitos desta Lei.

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Assim, nos parece sensato afirmar que o Conselho Federal de Medicina – CFM, no exercício de suas competências, pode e deve sancionar regulamentos quanto a utilização da telemedicina, e uma vez vedada a utilização deste método para os exames médicos ocupacionais o mesmo não pode ser implementado pelos empregadores e empresas que prestam serviços ocupacionais.

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Mas cabe aqui uma reflexão a ser realizada: Se durante a pandemia a telemedicina foi um sucesso e sua utilização auxiliou nas demandas médicas sem prejuízos, porque sua vedação ocorre neste momento para os exames médicos ocupacionais em que casos em que não haja grau de risco elevado e seja desnecessário a realização de exames complementares?

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Vale destacar que a anamnese, diálogo estabelecido entre profissional de saúde e paciente com o objetivo de ajudar a lembrar de situações e fatos que podem estar relacionados a algum tipo de doença é fator preponderante e amplamente utilizado para a realização dos exames médicos ocupacionais não sendo necessário na maioria dos casos a realização de qualquer exame presencial pelo profissional da saúde.

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A Lei n.º 14.510/2022 permite o atendimento a distância tanto na rede pública como nos hospitais e clínicas privadas, desde que o médico e o paciente concordem com a modalidade. No caso de recusa, o atendimento presencial deve ser garantido ao paciente, bem como é garantido ao médico ampla autonomia para decidir sobre a utilização ou não da telessaúde.

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Ainda que haja alegações de que o Atestado de Saúde Ocupacional – ASO realizado de maneira remota poderiam comprometer o Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional- PCMSO e comprometer a qualidade do serviço prestado, podendo afetar inclusive a saúde do trabalhador, o mesmo carece de respaldo fático, pois conforme explanado anteriormente existem comprovações de que o mesmo foi um sucesso durante a pandemia. E mais, não vislumbramos diferenças em uma consulta médica ao exame médico ocupacional simples que possamos distinguir tal vedação pela CFM.

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Ademais, não se pode, nem se deve ser vislumbrado a desvalorização dos serviços médicos, ou ainda das clínicas que prestam este tipo de serviço, uma vez que estes continuariam sendo necessários para atendimentos dos dispositivos legais pertinentes. O que deveria ocorrer é um avanço destes em detrimento das necessidades inerentes do setor empresarial que urge por soluções práticas e dinâmicas. Em tempos de informatização de dados, como eSocial, não podemos ser reféns de processos arcaicos e morosos para atendimento das necessidades trabalhistas.

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Com isto, a implementação da telemedicina ou telessaúde para os exames médicos ocupacionais mais simples parece ser não apenas necessária, mas sim um avanço para a modernização, celeridade e eficiência dos serviços médicos aos empregados e empregadores.

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Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da AASP.

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Emerson Climaco

Minibio: Gerente de Relações Trabalhista, Pós-Graduado em Direito e Processo do Trabalho com experiência de mais de 20 anos em atividades junto a empresas e escritórios de médio e grande porte.

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