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O papel do tributo e o combate à covid-19

Por Antonio Carlos de Almeida Amendola

Padre Antônio Vieira no “Sermão de Santo Antônio” ensina que o sal tem duas funções, a de conservar o alimento são e a de impedir que este estrague, que se corrompa. Da mesma forma, o tributo deve ser concebido, regulado e aplicado de modo a permitir a boa conservação do contribuinte e o devido cumprimento da obrigação tributária, sem ser pesado a ponto de corrompê-lo.  Trata-se, fora de dúvida, de princípio a ser observado por todos aqueles envolvidos em matéria tributária.

Em tempos de crise econômico-financeira decorrente da pandemia da COVID-19, com um isolamento social impensável nestes tempos, o Legislador e a Administração Tributária devem, mais do que nunca, se atentar a tal princípio, inerente ao princípio da preservação da empresa e do indivíduo.

Neste sentido, medidas já vêm sendo estudadas e tomadas a fim de aliviar o contribuinte, com redução de carga tributária, instituição de possibilidade de transação extraordinária, prorrogação de vencimento de tributos, postergação de data máxima de cumprimento de obrigações acessórias e facilitações em outras questões procedimentais, etc.  Listamos abaixo algumas destas medidas, sendo muito provável que, conforme já se noticia, outras virão até que esta crise se encerre.  Contribuintes, por outro lado, já sentindo fortemente os efeitos desta crise, vem procurando o Poder Judiciário a fim de obter postergações de tributos, sem penalidades e, em alguns casos, vêm logrando êxito na obtenção de medidas liminares.

Indicamos, abaixo, algumas das importantes medidas tributárias adotadas no combate à crise da COVID-19, que, certamente, serão seguidas de outras:

  1. Redução Temporária de Carga Tributária

I.A. Redução a zero das alíquotas de IOF-Crédito

O Decreto nº 10.305/2020, publicado em 02/04/2020, ao modificar o Regulamento do IOF, prevê a redução da alíquota (e do adicional de 0,38%) do IOF-Crédito para zero nas seguintes operações de crédito contratadas no período entre 03/04/2020 e 03/07/2020:

  1. a) operação de empréstimo, sob qualquer modalidade, inclusive abertura de crédito, ou sob a forma de financiamento, sujeitos à liberação de recursos em parcelas;
  2. b) operação de desconto, inclusive na de alienação a empresas de factoring de direitos creditórios resultantes de vendas a prazo;
  3. c) adiantamento a depositante;
  4. d) excessos de limite, ainda que o contrato esteja vencido; e,
  5. e) operações de financiamento para aquisição de imóveis não residenciais.

A redução aplica-se igualmente nos casos de prorrogação, renovação, novação, composição, consolidação, confissão de dívida e negócios assemelhados, de operação de crédito em que não haja substituição de devedor, desde que tais hipóteses ocorram entre 03/04/2020 e 03/07/2020.

A redução em questão vale para as operações contratadas no período acima indicado, independentemente da data do vencimento.

I.B. Redução das contribuições do “Sistema S”

Publicada em 31/03/2020, a Medida Provisória (“MP”) nº 932 prevê a redução temporária (entre 01/04/2020 e 30/06/2020) de alíquotas das contribuições ao chamado ‘Sistema S’, conforme abaixo: 

Contribuição Antes da MP 932/20 Alterações da MP 932/20
SESI, SESC e SEST 1,5% 0,75%
SESC, SENAT e SENAI 1% 0,5%
SESCOOP 2,5% 1,25%
SENAR

 

até 2,5% (folha de salários)

0,25% (receita bruta do produtor rural pessoa jurídica / agroindústria)

0,2% (receita bruta do produtor rural pessoa física)

1,25% (folha de salários)

0,125% (receita bruta do produtor rural pessoa jurídica / agroindústria)

0,10% (receita bruta do produtor rural pessoa física)

I.C. Redução à zero das alíquotas do II e IPI

Foram implementadas, temporariamente, com validade até 30/09/2020, (a) redução da alíquota do Imposto de Importação (“II”) para zero e (b) desoneração do Imposto sobre Produtos Industrializados (“IPI”) para itens de uso médico-hospitalar como álcool etílico, desinfetantes, gel antisséptico, vestuário e seus acessórios de proteção, de plástico, aparelhos de eletrodiagnóstico etc.

Atos normativos: Resolução CAMEX nº 17, publicada em 18/03/2020, Resolução CAMEX nº 22, publicada em 25/03/2020 e Decreto nº 10.285, publicado em 20/03/2020

  1. Prorrogação de Vencimento de Tributos

II.A. Contribuições sociais – Postergação do prazo para pagamento

As datas de vencimento das contribuições previdenciárias sobre a folha, do Funrural, da contribuição previdenciária do empregador doméstico, das contribuições ao PIS/Pasep e da COFINS foram postergadas com relação às competências dos meses de março e abril de 2020, conforme abaixo:

Contribuição social Competência Vencimento original Vencimento postergado para
Contribuições a cargo da empresa – sobre folha de pagamentos (cota patronal,  RAT, inclusive a segurado contribuinte individual), Funrural da Agroindústria, contribuição do empregador doméstico, e  contribuição do empregador rural pessoa física (Arts. 22, 22-A, 24 e 25 da Lei n. 8212/91) Março/2020 Abril/2020 Agosto/2020
Funrural da Pessoa Jurídica Produtora (Art. 25 da Lei n. 8.870/91)
CPRB – contribuição sobre a receita bruta de empresas de (em substituição à folha) – desoneração da folha (Arts. 7º e 8º da Lei n. 12.546/2011 Abril/2020 Maio/2020 Outubro/2020
PIS/COFINS (art. 18 da MP n. 2.158-35/01, art. 10 da Lei n. 10.637/02 e art. 11 da Lei nº 10.833/03)

Não está claro se a Portaria abrange efetivamente todas as empresas sujeitas à CPRB.

Ato Normativo: Portaria nº 139, publicada em 03/04/2020, e alterada pela Portaria nº 150, publicada em 07/04/2020.

II.B. Simples Nacional – Prorrogação de prazo  

Foi prorrogado o prazo para o pagamento dos tributos federais (IRPJ, CSLL, PIS/COFINS, IPI, contribuições previdenciárias) para as empresas optantes do SIMPLES NACIONAL, nos seguintes termos:

Período de Apuração Vencimento original Vencimento prorrogado
Março/2020 20/04/2020 20/10/2020
Abril/2020 20/05/2020 20/11/2020
Maio/2020 22/06/2020 21/12/2020

Ato Normativo: Resolução do Comitê Gestor do Simples Nacional nº 152, publicada em 18/03/2020

III. Postergação de Obrigações Acessórias

III.A. Obrigações acessórias de tributos federais

Foi prorrogado o prazo para entrega da Declaração de Débitos e Créditos Tributários Federais (“DCTF”), da Escrituração Fiscal Digital da Contribuição para o PIS/Pasep, da COFINS e da Contribuição Previdenciária sobre a Receita (EFD-Contribuições), nos seguintes termos:

Obrigação acessória

das competências de março, abril e maio de 2020

Vencimento original Vencimento postergado
DCTFs 15º dia útil dos meses de abril, maio e junho de 2020 15º dia útil do mês de julho de 2020
EFD-Contribuições 10º dia útil dos meses de abril, maio e junho de 2020 10º dia útil do mês de julho de 2020

Ato Normativo: Instrução Normativa nº 1932, publicada em 03/04/2020. 

III.B. Declaração de Imposto de Renda Pessoa Física (e do saldo do tributo)

O prazo de entrega da Declaração de Imposto de Renda Pessoa Física (“DIRPF”) e o início do pagamento de eventual imposto devido com o ajuste anual foi prorrogado para 30/06/2020. De acordo com o Secretário da Receita Federal do Brasil, o prazo foi postergado em dois meses para permitir que os contribuintes obtenham todos os documentos necessários para preparar a declaração.  Além disso, os contribuintes não precisarão informar o número do recibo de entrega da última declaração enviada.

Ato Normativo: Instrução Normativa nº 1.930, publicada em 01/04/2020

  1. Regularização de Passivo Fiscal

IV.A. Transação Extraordinária

Ciente de que a capacidade de geração de recursos por contribuintes foi reduzida por conta da crise da COVID-19, a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (“PGFN”) estabeleceu novas condições para parcelamento especial de débitos inscritos em dívida ativa da União, inclusive daqueles já parcelados. O parcelamento pode ser realizado em até 84 meses para contribuintes em geral (7 anos) e 100 meses (um pouco mais que oito anos) para pessoas físicas, micro e pequenas empresas, com o pagamento de entrada correspondente a 1% do valor dos débitos, que corresponde às primeiras três prestações. A primeira prestação vencerá no último dia útil de junho de 2020.  O prazo de adesão foi prorrogado para até a data final de vigência da Medida Provisória 899/2020.

Ato Normativo: Portaria nº 7.820, publicada em 18/03/2020 e Portaria nº 8.457, publicada em 25/03/2020 

  1. Outras Medidas Procedimentais 

V.A. Prorrogação da validade de Certidões de Regularidade Fiscal Federais (Receita Federal do Brasil – RFB/ Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional – PGFN)

As Certidões Negativas, ou Positivas com Efeitos de Negativa, de Débitos relativos a Créditos Tributários Federais e à Dívida Ativa da União, válidas em 23/03/2020, tiveram o vencimento do seu prazo de validade postergado por 90 dias.

Ato normativo: Portaria Conjunta RFB/PGFN nº 555, publicada em 24/03/2020

V.B. Suspensão dos prazos e procedimentos – RFB

Os prazos junto à Receita Federal do Brasil foram suspensos até 29/05/2020, em especial quanto a: intimações eletrônicas de cobrança, notificações de malha fina relacionadas ao imposto de renda de pessoas físicas, procedimento de exclusão de contribuinte de parcelamento por inadimplemento, registro de pendência de regularização no CPF motivado por falta de entrega de declaração, registro de inaptidão de pessoa jurídica por ausência de declaração, dentre outros.

Ato Normativo: Portaria RFB 543, publicada em 23/03/2020

V.C. Atos administrativos de cobrança da PGFN

 A PGFN determinou a suspensão, por até 90 dias, dos prazos relacionados a:

  1. protesto de certidões de dívida ativa;
  2. instauração de novos Procedimentos Administrativos de Reconhecimento de Responsabilidade – PARR;
  3. início de procedimentos de exclusão de contribuintes de parcelamentos administrados pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional por inadimplência de parcelas;
  4. impugnação e recurso de decisão proferida no Procedimento Administrativo de Reconhecimento de Responsabilidade – PARR;
  5. manifestação de inconformidade e recurso contra a decisão que apreciar no âmbito do processo de exclusão do Programa Especial de Regularização Tributária – PERT;
  6. oferta antecipada de garantia em execução fiscal; e
  7. Pedido de Revisão de Dívida Inscrita – PRDI e recurso contra a decisão que o indeferir.

Ato Normativo: Portaria nº 7.821, publicada em 18/03/2020

  1. Outras Medidas

VI.A. Variações cambiais de investimento de instituições financeiras em controladas no exterior – Tributação Parcela Correspondente ao Hedge

 As instituições financeiras domiciliadas no Brasil deverão incluir, no lucro real, a variação cambial da parcela com cobertura de risco (hedge) do valor do investimento em pessoas jurídicas controladas situadas no exterior, na proporção de: (a) 50% no exercício financeiro do ano de 2021; e (b) 100% a partir do exercício financeiro do ano de 2022.

Ato Normativo: Medida Provisória nº 930, publicada em 30/03/2020

Antonio Carlos de Almeida Amendola é advogado e conselheiro da Associação dos Advogados (AASP).

Fonte: Núcleo de Comunicação AASP

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