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Bate-papo com Domingos Sávio Zainaghi sobre a Lei Pelé

“Os legisladores querem acertar, mas algumas coisas eles não entendem, por exemplo, se eu for fazer uma alteração em uma lei penal e não conheço muito, talvez cometa algum equívoco”, Domingos Sávio Zainaghi.

Com pouco mais de duas décadas, a Lei nº 9.615, de 24 de março de 1998, popularmente conhecida como Lei Pelé, foi elaborada com o objetivo de trazer mais transparência e profissionalismo ao esporte brasileiro.

Falando um pouco de seus impactos e controvérsias, batemos um papo com o doutor e mestre em Direito do Trabalho, Domingos Sávio Zainaghi.

Acompanhe:

⚽️ Após pouco mais de duas décadas, a Lei n° 9.615/1998, popularmente conhecida como Lei Pelé, trouxe mais avanços ou retrocessos?

Domingos Sávio Zainaghi: Realmente ela trouxe avanços como o término do passe, não de uma maneira total, mas ao menos libera o atleta ao final do contrato, coisa que antes não existia. Ela também fala da rescisão direta no contrato de trabalho por atraso nos salários, das férias para todos os atletas, e reconhece atletas de todas as modalidades como profissionais, porém tem alguns problemas pontuais.

⚽️ Quais?

Domingos Sávio Zainaghi: Ao meu ver ela sofre com um grave tecnicismo: a troca da natureza jurídica de alguns institutos, por exemplo. O direito de arena, que era de 20% daquilo que os atletas recebiam, diminui para 5%. O direito de arena foi reconhecido como natureza jurídica remuneratória, e ele diz que é de natureza civil, que o atleta de modalidade individual pode ser contratado por contrato civil, e a justiça vem anulando esses contratos. Mas é um caminho, a gente só aprende a andar quando criança caindo. Praticando a democracia erramos e acertamos, e a Lei Pelé tem esse aspecto: foi um avanço, sim, mas tem seus problemas.

⚽️ A Lei Pelé e o Direito do Trabalho falam a mesma língua?

Domingos Sávio Zainaghi: Brinco com os meus colegas do Direito Desportivo e com meus alunos que se atrevem a desbravar a área trabalhista que o Direito do Trabalho não é para qualquer um, ou seja, a Lei Pelé fala de jornada semanal, e jornada é dia de trabalho; fala de contrato especial de trabalho desportivo, algo que não tem nada de especial; trata essa história da natureza civil de alguns institutos…. Não tenho receio em dizer que o legislador se atrapalhou um pouco.

⚽️ E isso ocorreu por mero desconhecimento?

Domingos Sávio Zainaghi: Só agora estamos sendo um pouco mais ouvidos nas alterações. Com a criação da Academia Nacional de Direito do Trabalho, por um ministro do TST, o Direito Desportivo está comandado pelos trabalhistas do país, e a gente está dando uma contribuição. Os legisladores querem acertar, mas algumas coisas eles não entendem, por exemplo, se eu for fazer uma alteração em uma lei penal e não conheço muito, talvez cometa algum equívoco por não a conhecer, entende? Ela tem esses equívocos técnicos. No passado dizia-se que o atleta não tinha direito a hora extra, e ele tem. Enfim, talvez tenha passado uma ideia de pessimismo, mas eu sou otimista, eu acho que está no caminho certo, porém há muito dinheiro envolvido, principalmente no futebol.

⚽️ Um dinheiro para poucos?

Domingos Sávio Zainaghi: Quem ganha muito dinheiro com o futebol é uma parcela bem pequena. Veja, acima de R$ 500 mil devemos ter por volta de cinco atletas atuando no Brasil; em média, atleta ganha por volta de três salários, acima disso, a faixa maior são aqueles atletas que ganham entre R$ 100 e 500 mil.

⚽️ Falando dos clubes, a Lei Pelé trouxe uma concorrência desleal?

Domingos Sávio Zainaghi: Teria sido pior se a Lei Pelé tivesse se mantido como se manteve no início ao tratar a relação com os clubes como uma relação comum, porque hoje já está complicado para o clube pequeno se manter, a não ser o clube empresa. Raramente um ou outro consegue chegar em uma final, mas roda, roda, roda e aqui em São Paulo a coisa fica entre Corinthians, São Paulo, Palmeiras e Santos. No fim das contas, o que acaba acontecendo, fecham. Os clubes menores contratam técnicos para três meses, jogadores para três meses, e a grande parte dos atletas fica sem trabalhar.

⚽️ Quais consequência isso traz?

Domingos Sávio Zainaghi: O desemprego é um deles. Fato que ainda é agravado porque você mexe com sonhos. Você tem o seu sonho de se tornar o melhor jornalista, eu sempre sonhei em ser um grande advogado, um grande professor, mas dentro das nossas profissões temos essa possibilidade, pois depende mais da gente. O atleta não. Ele depende de circunstâncias. Conheço muitos jogadores que são bons no futebol, mas que não vão para a frente porque não têm um staff e não tem ninguém interessado.

⚽️ Com os rumos atuais, a Lei Pelé ainda tem fôlego para se manter efetiva?

Domingos Sávio Zainaghi: Essas duas últimas décadas foram de grande aprendizado. Quando comecei a tratar deste assunto eu não tinha nem livros para pesquisar. Hoje nós temos muitos livros sobre esse assunto, e mais que isso, uma juventude que se dedica plenamente ao Direito Desportivo. A lei teve esse mérito. Essa história de a lei ter problemas é normal, mais ela fez o jovem se engajar, e isso ainda trará muitos frutos.

Fonte: Núcleo de Comunicação AASP

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