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Atendimento às mulheres em situação de violência doméstica e familiar em meio à Pandemia

Diário Oficial da União

Publicado em: 02/06/2020 Edição: 104 Seção: 1 Página: 8

Órgão: Ministério da Cidadania/Secretaria Especial do Desenvolvimento Social/Secretaria Nacional de Assistência Social

Portaria nº 86/2020

Aprova recomendações gerais para o atendimento às mulheres em situação de violência doméstica e familiar na rede socioassistencial do Sistema Único de Assistência Social – SUAS no contexto da Pandemia do novo Coronavírus, Covid-19.

A SECRETÁRIA NACIONAL DE ASSISTÊNCIA SOCIAL, do Ministério da Cidadania, no uso das atribuições que lhe confere a Portaria nº 115, de 20 de março de 2017, do então Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário, com fundamento na Portaria nº 337, de 24 de março de 2020, do Ministério da Cidadania, que dispõe sobre medidas para o enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus, COVID-19, no âmbito do Sistema Único de Assistência Social e com fundamento no Decreto nº 9.674, de 02 de janeiro de 2019, e

Considerando a Declaração de Emergência em Saúde Pública de Importância Internacional pela Organização Mundial da Saúde em 30 de janeiro de 2020, em decorrência da Infecção Humana pelo novo coronavírus (COVID-19);

Considerando a disseminação do novo coronavírus (COVID-19) e sua classificação mundial como pandemia, e as medidas adotadas no âmbito de estados, municípios e do Distrito Federal para prevenir a disseminação do vírus, e a importância de o Estado brasileiro garantir a oferta regular de serviços e programas socioassistenciais voltados à população mais vulnerável e em risco social e promover a integração necessária entre o Sistema Único de Assistência Social e o Sistema Único de Saúde;

Considerando a Portaria MS nº 188, de 4 de fevereiro de 2020, que declara Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional (ESPIN), em decorrência da Infecção Humana pelo novo coronavírus (2019-nCoV),

Considerando a Portaria MC nº 369, de 29 de abril de 2020, dispõe sobre o repasse financeiro emergencial de recursos federais para a execução de ações socioassistenciais e estruturação da rede do Sistema Único de Assistência Social – SUAS, no âmbito dos estados, Distrito Federal e municípios devido à situação de Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional – ESPIN, em decorrência de infecção humana pelo novo coronavírus, Covid-19;

Considerando a Portaria MC nº 378, de 7 de maio de 2020, que dispõe sobre repasse de recurso extraordinário do financiamento federal do Sistema Único de Assistência Social para incremento temporário na execução de ações socioassistenciais nos estados, Distrito Federal e municípios devido à situação de Emergência em Saúde Pública de Importância Internacional decorrente do coronavírus, Covid-19, resolve:

Art. 1º Aprovar, na forma do Anexo, a Nota Técnica nº 25/2020, com recomendações gerais para o atendimento às mulheres em situação de violência doméstica e familiar na rede socioassistencial do Sistema Único de Assistência Social – SUAS no contexto da pandemia do novo Coronavírus, Covid-19.

Parágrafo Único. Nos termos da Portaria nº 337, de 24 de março de 2020, do Ministério da Cidadania, estados, municípios e Distrito Federal devem compatibilizar a aplicabilidade destas recomendações conforme as normativas e as condições de saúde pública local.

Art. 2º Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.

MARIANA DE SOUSA MACHADO NERIS

 

ANEXO

NOTA TÉCNICA Nº 25/2020

ASSUNTO: recomendações gerais para o atendimento às mulheres em situação de violência doméstica E FAMILIAR NO ÂMBITO DA REDE SOCIOASSISTENCIAL DO SISTEMA ÚNICO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL No contexto da pandemia do novo Coronavírus, Covid-19.

SUMÁRIO

1. Introdução.

2. Proteção das mulheres em situação de violência doméstica e familiar no contexto da pandemia.

3. Recomendações gerais ao órgão gestor da política de assistência social, unidades e serviços socioassistenciais.

4. Medidas direcionadas para a prevenção e o cuidado com as equipes de Proteção Social Especial de Média e Alta Complexidade do SUAS.

5. Orientações para a atuação das equipes do Serviço de Proteção e Atendimento Especializado a Famílias e Indivíduos (PAEFI) para o atendimento no CREAS de mulheres em situação de violência doméstica e familiar.

6. Medidas destinadas ao funcionamento e continuidade da oferta dos Serviços de Acolhimento para Mulheres em Situação de Violência Doméstica e familiar.

7. Outras ofertas para atender às necessidades de acolhimento das mulheres em situação de violência doméstica e familiar.

8. Outras questões relevantes.

9. Documentos relacionados.

1.INTRODUÇÃO

1.1. A presente Nota Técnica integra um conjunto de medidas e orientações que o Ministério da Cidadania, por meio da Secretaria Nacional de Assistência Social (SNAS), tem desenvolvido, visando orientar gestores e trabalhadores do Sistema Único de Assistência Social (SUAS), diante do atual cenário de pandemia relacionado ao novo Coronavírus – Covid-19.

1.2. Conforme Decreto nº 10.282, de 20 de marco de 2020, que regulamenta a Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, a Assistência Social e o atendimento à população em estado de vulnerabilidade são considerados essenciais, o que inclui serviços destinados ao atendimento a mulheres vítimas de violência, cuja continuidade deve ser assegurada no contexto da pandemia.

1.3. Dessa forma, tais serviços devem continuar em funcionamento, seguindo as orientações sanitárias para a garantia da proteção da saúde de usuários e trabalhadores, com a possibilidade de realização das adaptações ou reorganização necessárias, de modo a garantir proteção social às pessoas mais vulneráveis a violações de direitos nesse contexto de enfrentamento da pandemia[1].

1.4. Para tanto, o cenário exige a adoção de medidas, procedimentos e a reorganização de unidades e serviços, a fim de assegurar proteção e apoiar o distanciamento social, especialmente aos grupos considerados de risco, além de mitigar possível transmissibilidade. Estas providências de caráter emergencial devem alcançar a gestão e a totalidade das unidades e serviços, incluindo os de natureza pública estatal e os prestados pelas entidades de assistência social, ainda que não recebam recursos públicos.

1.5. Apresenta-se neste documento algumas recomendações para gestores, trabalhadores do SUAS, coordenadores ou dirigentes de unidades de atendimento e serviços. O objetivo é orientar quanto à organização e o funcionamento da rede socioassistencial de Proteção Social Especial nos territórios, visando assegurar a oferta de proteção social às mulheres em situação de violência doméstica e familiar no presente cenário.

1.6. As orientações e recomendações apontadas nesta Nota Técnica abordam as especificidades dos serviços e ações voltadas ao atendimento a mulheres vítimas de violência doméstica e familiar e complementam outros documentos do Ministério da Cidadania, já divulgados anteriormente:

a) Portaria MC nº 337, de 24 de março de 2020, que dispõe acerca de medidas para o enfrentamento da emergência em saúde pública decorrente da COVID-19, no âmbito do SUAS;

b) Portaria MC nº 54, de 1º de abril de 2020, que reúne recomendações a gestores e trabalhadores do SUAS visando assegurar a continuidade da oferta de serviços e atividades essenciais da Assistência Social, garantindo a segurança e a saúde de usuários e profissionais;

c) Nota Pública do Ministério da Cidadania e do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, de 20 de março de 2020: que apresenta “Medidas de Prevenção ao Coronavírus nas Unidades de Acolhimento Institucional”.

1.7. Em complemento, faz-se necessário observar as recomendações emanadas e atualizadas continuamente pelo Ministério da Saúde[2], por autoridades sanitárias locais e, especialmente, normativas complementares do Ministério da Cidadania, atualizadas no Blog da Rede SUAS[3].

1.8. As sugestões e recomendações previstas neste documento devem ser compatibilizadas localmente e avaliadas quanto à sua aplicabilidade e benefício a usuários e trabalhadores. O seu escopo não impede que a gestão da Assistência Social, de forma articulada com dirigentes das unidades e serviços socioassistenciais, planeje outros arranjos que melhor se adequem à realidade local, desde que sejam benéficos à população atendida e estejam de acordo com as recomendações sanitárias.

_____________________________________

[1]A Portaria nº 337, de 24 de março de 2020, dispõe sobre as medidas para o enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do Coronavírus, COVID-19, no âmbito do Sistema Único de Assistência Social.

[2]Fontes: https://coronavirus.saude.gov.br/sobre-a-doenca; https://covid.saude.gov.br/.

[3]Fonte: http://blog.mds.gov.br/redesuas/.

2. PROTEÇÃO DAS MULHERES EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR NO CONTEXTO DA PANDEMIA

2.1. De acordo com a publicação Gênero e COVID-19 na América Latina e no Caribe: dimensões de gênero na resposta da ONU Mulheres[1], de março de 2020, em um contexto de emergência, crescem os riscos de violência contra mulheres e meninas, especialmente a violência doméstica.

2.2. O aumento do risco de as mulheres sofrerem violência doméstica e familiar nesse período de distanciamento social deve-se ao aumento das tensões em casa e também ao confinamento das mulheres. As mulheres vítimas de violência doméstica e familiar podem enfrentar obstáculos adicionais em meio à pandemia da Covid-19, como mais dificuldade de acesso aos serviços de proteção (pelas restrições de circulação nas cidades ou por interrupção das ofertas dos serviços) e barreiras para se separar do parceiro violento devido ao impacto econômico na vida de suas famílias, principalmente no caso das trabalhadoras informais ou domésticas.

2.3. Estudos recentes em alguns países que já estavam lidando com a pandemia da COVID-19 antes de sua chegada ao Brasil têm associado o isolamento social a perturbações como ansiedade, fobias, depressão, ideação suicida e agressividade. De fato, há risco de a violência nos espaços domésticos e contextos familiares aumentar quando as famílias são colocadas sob tensão, isolamento e quarentena. Nessas situações, as principais vítimas costumam ser crianças, adolescentes e mulheres.

2.4. A realidade da violência doméstica e familiar contra as mulheres[2]não é um fato novo, nem decorre exclusivamente da situação de isolamento social, mas nos países que passaram por essa fase da pandemia houve um aumento das denúncias desse tipo de violência.

2.5. De acordo com a publicação “Saúde mental e atenção psicossocial na pandemia COVID-19. Violência doméstica e familiar na COVID-19”, da FIOCRUZ, os indicadores de países como China e França, além do próprio Brasil, evidenciam que, no contexto da atual pandemia, os casos de violência já existentes se agravam e, ao mesmo tempo, emergem novos casos: “Na China, os números da violência doméstica triplicaram; na França houve um aumento de 30% das denúncias e, no Brasil, estima-se que as denúncias tenham aumentado em até 50%”.

2.6. Vale registrar que, atualmente, o Brasil ocupa o 5º lugar no ranking mundial de feminicídio, segundo o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH), ficando atrás somente de El Salvador, Colômbia, Guatemala e Rússia em número de casos de assassinato de mulheres. Já em comparação com países desenvolvidos, tem-se no Brasil: 48 vezes mais assassinatos de mulheres que o Reino Unido, 24 vezes a mais que a Dinamarca e 16 vezes a mais que o Japão e a Escócia[3].

2.7. Diante disso, reforça-se a necessidade de garantir a continuidade dos serviços socioassistenciais essenciais para a prevenção de violações de direitos e proteção de mulheres vítimas de violência doméstica e familiar, os quais devem desenvolver novas estratégias de atuação diante do contexto atual.

____________________________

[1]Disponível em: http://www.onumulheres.org.br/wp-content/uploads/2020/03/ONU-MULHERES-COVID19_LAC.pdf

[2]Para os efeitos desta Nota Técnica, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial (Artigo 5º da Lei nº 11.340 de 2006 – Lei Maria da Penha).

[3]UNIFESP. Brasil é o 5° país que mata mais mulheres. Disponível em: https://www.unifesp.br/reitoria/dci/publicacoes/entreteses/item/2589-brasil-e-o-5-pais-que-mais-mata-mulheres

3. RECOMENDAÇÕES GERAIS AO ÓRGÃO GESTOR DA POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL, UNIDADES E SERVIÇOS SOCIOASSISTENCIAIS

3.1. No atual contexto de Emergência em Saúde Pública, o papel do órgão gestor da Assistência Social na coordenação da rede socioassistencial é elemento central para a organização e implementação das ações necessárias no âmbito do SUAS para a proteção de mulheres em situação de violência doméstica e familiar.

3.2. A gestão local, de forma coordenada e estratégica, deve mapear demandas, orientar e prestar o apoio necessário a todas as unidades com a oferta de serviços socioassistenciais a este público, incluindo a rede governamental e as entidades de assistência social, inclusive as que porventura não recebam recursos públicos.

3.3. É importante partir de um diagnóstico local da rede socioassistencial que permita identificar adequações urgentes e necessárias e planejar respostas ágeis para mitigar riscos e proteger usuários e trabalhadores, por meio de um Plano de Contingência, por exemplo. Especial atenção deve ser dada aos grupos de risco e aos Serviços de Acolhimento Institucional – considerando riscos de transmissibilidade decorrentes do caráter coletivo destes serviços e do fluxo diário de entrada e saída de pessoas.

3.4. O planejamento e a implementação de medidas e procedimentos para as adequações da rede socioassistencial devem ser realizados, preferencialmente, de forma articulada com a rede de saúde, observando o curso da pandemia em cada localidade e as recomendações e regulamentações continuamente atualizadas pelos Ministérios da Saúde e da Cidadania, e pelas autoridades sanitárias locais.

3.5. A seguir, destacam-se algumas medidas recomendadas aos órgãos gestores de Assistência Social e aos coordenadores dos serviços e unidades socioassistenciais, com o intuito de assegurar atendimento e proteção neste contexto de pandemia.

3.6. Quanto à organização e suporte à rede socioassistencial

a) Definir e manter a oferta de serviços e atividades essenciais, conforme recomendações dispostas na Portaria SNAS nº 54, de 1º de abril e 2020, considerando as vulnerabilidades da população no contexto de pandemia;

b) Levantar informações e planejar ações de contingência, em conjunto com os coordenadores das unidades socioassistenciais, criando canais que facilitem a comunicação entre tais unidades e a gestão local;

c) Reorganizar as ofertas dos serviços de Proteção Social Especial de Média e Alta Complexidade para o atendimento e acompanhamento de mulheres vítimas de violência doméstica e familiar;

d) Atuar no sentido de promover a articulação e integração entre os serviços da rede pública estatal e não estatal, de Proteção Social Básica e de Proteção Social Especial de Média e Alta Complexidade, no atendimento às mulheres em situação de violência doméstica e familiar, inclusive para acesso a benefícios;

e) Adotar novos processos de trabalho e fluxos de informações entre a gestão e os serviços socioassistenciais, atualizando diariamente as ações realizadas e os resultados obtidos;

f) Adotar medidas que respeitem as especificidades das mulheres na execução das ofertas, observando as necessidades das idosas, com deficiência, com transtorno mental, LGBT, imigrantes, indígenas, dentre outras;

g) Avaliar a possibilidade de regulamentação de benefícios eventuais (conforme previsto na LOAS[1]e nas Diretrizes Gerais de Abrigamento a Mulheres em situação de Risco e de Violência[2]) para minimizar as vulnerabilidades sociais das mulheres em situação de violência doméstica e familiar, tais como: auxílio alimentação, aluguel social, entre outros;

h) Adotar medidas para que as mulheres em situação de violência doméstica e familiar possam acessar o auxílio emergencial, conforme a Lei nº 13.982, de 2 de abril de 2020;

i) Adotar estratégia para a realização de atendimento remoto (à distância) pelos profissionais do SUAS, utilizando os meios de comunicação disponíveis (telefonemas, aplicativos de mensagens – como o WhatsApp, chamadas de vídeo, áudios, mensagens de texto, entre outros), visando facilitar e ampliar o acesso das mulheres que necessitam do atendimento durante a pandemia;

j) Assegurar ampla divulgação às mulheres de informações sobre o funcionamento das unidades e dos serviços socioassistenciais, horários de atendimento e contatos para informações e agendamentos, quando for o caso, em meios acessíveis que alcancem as pessoas com deficiência;

k) Adotar medidas e procedimentos para mitigar riscos relacionados à COVID-19 nas unidades do SUAS, incluindo, quando necessário, a reorganização de unidades existentes ou a organização, em caráter emergencial, de novas unidades;

l) Disponibilizar ou fornecer meios para aquisição de Equipamentos de Proteção Individual (EPI), recomendados na Nota Técnica GVIMS/CGTES/ANVISA Nº 05/2020, e articular com o órgão gestor da saúde para oferta de capacitação aos trabalhadores do SUAS quanto ao uso correto de EPI e procedimentos para prevenir a transmissibilidade;

m) Capacitar e prestar informações quanto à prevenção da transmissibilidade e atuação em casos suspeitos e confirmados de COVID-19, destacando as questões específicas relativas a unidades de atendimento coletivo a grupos de risco, como as unidades de acolhimento;

n) Prestar apoio técnico e material às unidades de acolhimento que precisem reorganizar o serviço, seu espaço físico e estrutura ou, ainda, providenciar o remanejamento das pessoas acolhidas.

3.7. Quanto à articulação com a Rede de Atenção à Saúde do SUS

3.7.1. A articulação entre os órgãos gestores das políticas de Saúde e Assistência Social no município ou Distrito Federal deve assegurar o suporte necessário às unidades socioassistenciais, incluindo a colaboração na definição de medidas voltadas à prevenção da transmissibilidade do novo Coronavírus e na construção de fluxos e protocolos para o atendimento em casos de suspeita ou contaminação, com destaque para as seguintes ações:

a) Planejar as ações voltadas para o atendimento e acolhimento das mulheres vítimas de violência doméstica e familiar a partir da articulação local dos gestores da Assistência Social com os gestores da Saúde, quanto às recomendações sanitárias locais para prevenção da contaminação pelo novo Coronavírus nas unidades socioassistenciais e para lidar com casos de suspeita ou confirmação da doença, em especial sobre os cuidados com as mulheres idosas e/ou com comorbidades crônicas e as grávidas, considerando os fluxos locais para comunicação e atendimento pelo SUS, além de procedimentos recomendados para afastamentos, isolamento e cuidados;

b) Construir fluxos e procedimentos para o referenciamento e monitoramento das unidades e serviços socioassistenciais que atendem mulheres vítimas de violência, especialmente as unidades de acolhimento, pelas unidades de Atenção Primária à Saúde (APS), equipe de Saúde da Família de referência no território, ou outro arranjo que os órgãos gestores da Saúde e Assistência Social entenderem mais efetivos para a realidade local;

c) Pactuar com a gestão local da Saúde procedimentos para acesso a medicamentos, vacinação (se for o caso) e atendimento, especialmente nos casos de suspeita ou confirmação de contaminação pelo novo Coronavírus, entre usuários e trabalhadores do SUAS;

d) Planejar ações integradas em conjunto com a Vigilância Socioassistencial e a Vigilância em Saúde, mapear riscos e situações que venham a intensificar a vulnerabilidade e risco das mulheres no contexto da pandemia;

e) Realizar a identificação territorial da rede do SUS para encaminhamento das mulheres que sofreram violência doméstica e familiar, bem como por outras questões de saúde, quando for o caso;

f) Criar fluxos entre os serviços socioassistenciais e a Rede de Atenção Psicossocial-RAPS composta pelos Centros de Atenção Psicossocial e outras unidades (tais como os serviços especializados de atenção à violência sexual)[3], para que as mulheres em situação de violência doméstica ou familiar possam receber o devido acompanhamento psicoterapêutico, se assim desejarem, para superação dos danos emocionais decorrentes das violências sofridas.

3.8. Quanto à articulação com outros atores da Rede de Atendimento à Mulher em situação de Violência, demais políticas públicas, Organizações da Sociedade Civil e Movimentos Sociais:

3.8.1. A rede de atendimento à mulher em situação de violência está dividida em quatro principais áreas: saúde, justiça, segurança pública e assistência social, sendo composta por duas principais categorias de serviços: especializados e não-especializados.

3.8.2. No que tange aos serviços especializados, a rede de atendimento é composta por: Centros de Referência de Assistência Social (CREAS), Centros de Referência/Especializado de Atendimento à Mulher (CRAM/CEAM), Casas Abrigo/serviços de acolhimento para mulheres em situação de violência doméstica e familiar, Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher, Núcleos da Mulher nas Defensorias Públicas, Promotorias Especializadas, Juizados Especiais de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher e Central de Atendimento à Mulher – Ligue 180.

3.8.3. Além desses atores, existem nos municípios e Distrito Federal organizações da sociedade civil e movimentos sociais que atuam no atendimento e defesa de direitos de mulheres vítimas de violência.

3.8.4. Para garantir o atendimento adequado às mulheres vítimas de violência ou em risco de sofrer violência, faz-se necessária a articulação entre o órgão gestor da Assistência Social, coordenadores dos serviços socioassistenciais que atendem esse público e os demais atores da rede de atendimento à mulher em situação de violência.

3.8.5. Nesse sentido, indica-se:

a) Pactuar novos processos de trabalho, protocolos e fluxos de atuação nos territórios com os atores da rede intersetorial que atuam na perspectiva da promoção, garantia e defesa de direitos das mulheres em situação de violência doméstica e familiar em decorrência da reorganização do funcionamento dos órgãos devido à necessidade de distanciamento social;

b) Planejar ações integradas em conjunto com os Organismos de Políticas para as Mulheres[4]Estaduais e Municipais;

c) Verificar a possibilidade de disponibilização de imóveis para viabilizar a implantação de novas unidades de atendimento e acolhimento temporário, quando necessário, resguardando o caráter sigiloso do serviço de acolhimento;

d) Garantir o direito à segurança alimentar e nutricional das mulheres em situação de violência doméstica ou familiar e seus dependentes, através da articulação com Sistema de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN);

e) Promover consultas com organizações comunitárias de mulheres sobre as necessidades e as medidas apropriadas para ofertar proteção às mulheres vítimas de violência doméstica e familiar nesse contexto da pandemia;

f) Articular com as coordenações regionais da Fundação Nacional do Índio (FUNAI) nos atendimentos ofertados às mulheres indígenas;

g) Adotar os Parâmetros de atuação do SUAS no sistema de garantia de direitos da criança e do adolescente vítima ou testemunha de violência caso alguma criança e/ou adolescente seja testemunha de violência doméstica e familiar contra a mulher.

3.9. Quanto aos trabalhadores do SUAS

3.9.1. O órgão gestor da Assistência Social deve planejar medidas de proteção e segurança no trabalho e prevenção do adoecimento dos trabalhadores do SUAS, inclusive psicológico ou emocional, e ainda medidas de recomposição da força de trabalho, para assegurar a continuidade da oferta dos serviços em casos de afastamento de trabalhadores.

3.9.2. Quando necessária a recomposição ou aumento da força de trabalho nos serviços do SUAS que atendem mulheres vítimas de violência, pode-se recorrer a alternativas como:

a) remanejamento de profissionais de outros serviços do SUAS (da rede pública e privada) ou até mesmo de outras políticas públicas, cujas atividades tenham sido temporariamente reduzidas ou suspensas; e

b) contratação temporária em caráter emergencial de novos trabalhadores, dentre outros arranjos possíveis localmente.

3.9.3. Os novos profissionais devem receber capacitação e orientações prévias quanto ao desenvolvimento das atividades e quanto às recomendações e procedimentos necessários para a prevenção da transmissibilidade do novo Coronavírus (COVID-19), incluindo recomendações do Ministério da Saúde, das autoridades sanitárias locais e do Ministério da Cidadania, devendo contemplar a importância do distanciamento social, medidas de cuidados de higiene individuais, correto manejo das pessoas acolhidas, uso de EPI e outras ações preventivas à transmissibilidade.

3.10. Quanto aos recursos financeiros

3.10.1. Na implementação de medidas, procedimentos e reorganização das ofertas abordadas neste documento, poderão ser utilizados, além de recursos próprios, aqueles disponibilizados via cofinanciamento federal repassados a municípios, Distrito Federal e estados, incluindo recursos voltados ao enfrentamento da emergência de saúde pública decorrente do COVID-19, previstos na MP nº 953, de 15 de abril de 2020, observadas:

a) Portaria Conjunta SNAS/SEDS e SGFT nº 1, de 2 de abril de 2020, do Ministério da Cidadania.

b) Portaria MC nº 369, de 29 de abril de 2020;

c) Portaria MC nº 378, de 7 de maio de 2020, e outras Portarias que venham a regulamentar a destinação de recursos previstos na MP nº 953, de 15 de abril de 2020.

3.10.2. Para atender as demandas decorrentes da pandemia, recomenda-se aos municípios, estados e ao Distrito Federal avaliar possibilidades de flexibilização do uso de recursos pelas entidades de assistência social com as quais possuam parceria, quando executarem os serviços aqui abordados, por exemplo, os Serviços de Acolhimento e de Abordagem Social. Recomenda-se avaliação quanto à possibilidade de: adotar mecanismos e instrumentos que assegurem maior agilidade no repasse e na utilização de recursos e na prestação de contas; e de aditamento das parcerias, de modo a viabilizar o uso dos recursos para atender as demandas específicas do período de emergência em saúde pública.

________________________________

[1]Lei Orgânica de Assistência Social, Lei nº 8.742/1993.

[2]BRASIL. Diretrizes Nacionais para o Abrigamento de Mulheres em situação de Risco e de Violência. Secretaria Nacional de Políticas para as Mulheres/Secretaria Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres. Brasília: 2011.

[3]Embora esses serviços atendam preferencialmente situações de violência sexual (inclusive no âmbito doméstico), alguns realizam atendimento a outros tipos de violência doméstica e familiar contra a mulher. É possível acessar a lista de serviços e seus endereços no Cadastro Nacional de Estabelecimentos de saúde (relatórios, serviços especializados, código 165). http://cnes2.datasus.gov.br/Mod_Ind_Especialidades.asp?VEstado=&VMun=00&VComp=00&VTerc=00&VServico=165

[4]Os organismos de políticas para as mulheres (OPM) são os órgãos responsáveis pela formulação e implementação das políticas para as mulheres em estados e municípios. Mais informações sobre os OPMs estão disponíveis na página eletrônica da Secretaria Nacional de Políticas para as Mulheres: https://www.gov.br/mdh/pt-br/navegue-por-temas/politicas-para-mulheres.

4. MEDIDAS DIRECIONADAS PARA A PREVENÇÃO E O CUIDADO COM AS EQUIPES DE PROTEÇÃO SOCIAL ESPECIAL DE MÉDIA E ALTA COMPLEXIDADE DO SUAS

4.1. Para prevenção e o cuidado com as equipes de Proteção Social Especial de Média e Alta complexidade do SUAS, importante a adoção das seguintes medidas:

a) O órgão gestor local da Assistência Social deve adotar as recomendações do Ministério da Saúde e das autoridades sanitárias locais para garantir a segurança do trabalho e condições básicas para os profissionais do SUAS no atendimento à população, incluindo a oferta de EPI e capacitação para os trabalhadores que estiverem em contato direto com os usuários;

b) Disponibilizar materiais de higiene (sabonete líquido, álcool em gel, toalhas de papel, lenços umedecidos etc.), materiais de limpeza para higienizar superfícies e objetos e equipamentos de proteção individual (EPI), como máscaras cirúrgicas, luvas de procedimento, entre outros, para os serviços;

c) Intensificar a rotina de limpeza e higienização de espaços e superfícies, em especial de maçanetas, corrimãos, mesas e cadeiras de uso comum;

d) Afastar das atividades os profissionais que apresentem sintomas como febre, tosse e dificuldade para respirar, orientando-os a procurar orientação médica (inclusive por meio do TeleSUS – 136) e realizar isolamento domiciliar, apoiando-os no que couber;

e) Realocar para atividades que não tenham contato com o público ou priorizar trabalho remoto para os profissionais idosos e/ou integrantes de outros grupos de risco, conforme critérios da OMS e do Ministério da Saúde, assim como daqueles que coabitam com pessoas com essas características;

f) Evitar reuniões presenciais de equipe, mantendo somente aquelas estritamente necessárias. De preferência, as reuniões de equipe deverão ocorrer em locais amplos e arejados ou por meios de comunicação virtuais;

g) Suspender eventos, encontros, cursos de formação, oficinas, entre outras atividades coletivas presenciais;

h) Lavar bem as mãos (dedos, unhas, punho, palma e dorso) com água e sabão, evitando levá-las aos olhos, nariz, boca e ouvidos e, de preferência, utilizar toalhas de papel para secá-las. A lavagem das mãos deve ser repetida diversas vezes ao dia, especialmente antes e após a realização de tarefas em que haja contato com as usuárias;

i) Utilizar álcool em gel com frequência ao longo do dia e sempre que não for possível lavar as mãos;

j) Quando espirrar ou tossir, cobrir o nariz e a boca com cotovelo flexionado ou com um lenço de papel e, em seguida, descartá-lo na lixeira. Evitar tocar olhos, nariz, boca e ouvidos se as mãos não estiverem limpas;

k) Evitar contato próximo com as pessoas (manter distanciamento de 1 metro, no mínimo), tanto profissionais do serviço quanto usuárias, evitando cumprimentos pessoais com contato físico (beijos, abraços e apertos de mão);

l) Não compartilhar objetos de uso pessoal, como celular, talheres, pratos, copos, xícaras, garrafa de água, pente, escova de cabelos, dentre outros.

5. ORIENTAÇÕES PARA A ATUAÇÃO DAS EQUIPES DO SERVIÇO DE PROTEÇÃO E ATENDIMENTO ESPECIALIZADO A FAMÍLIAS E INDIVÍDUOS (PAEFI) PARA O ATENDIMENTO NO CREAS DE MULHERES EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR

5.1. O convívio familiar pode ser desafiador em alguns contextos, suscitando ou agravando situações de vulnerabilidade e risco individual e social e até mesmo desencadeando situações de violência, que incidem especialmente sobre crianças, adolescentes, pessoas idosas e mulheres.

5.2. Frente à permanência prolongada da população no ambiente doméstico durante o período de distanciamento social devido à pandemia, associada a outras situações de estresse, vulnerabilidades e riscos sociais é importante que haja alternativas de prevenção e proteção a mulheres em situação de violência e violação de direitos nesses espaços.

5.3. Nesse contexto, torna-se ainda mais importante o trabalho social desenvolvido pelas equipes do PAEFI, o qual pode intervir qualitativamente nessas situações no sentido de prevenir a ocorrência ou evitar a reincidência dessas situações.

5.4. Para tanto, é importante adotar estratégias de identificação de vulnerabilidades no contexto da pandemia e oferecer suportes e apoios para amenizar seus impactos sobre as condições de sobrevivência e sobre as relações na família, mitigando o risco de violência, rompimento de vínculos familiares e comunitários e demandas por serviços de acolhimento.

5.5. O CREAS – ou o técnico de referência da PSE, onde não houver – deve funcionar como referência nos territórios para a articulação dos diferentes atores que atuam com mulheres em situação de violência doméstica e familiar, quando não houver outro serviço de referência, visando a integração das ações com as demais políticas públicas, o sistema de justiça, a sociedade civil e movimentos sociais;

5.6. A equipe do PAEFI deve adotar estratégias para a identificação e mapeamento de alguns públicos prioritários que requeiram a atenção das equipes para sua proteção, sobretudo no contexto da pandemia, como mulheres com vivência de violência, em especial, de violência doméstica;

5.7. A equipe do PAEFI deve adotar estratégias para a realização de atendimentos remotos, disponibilizando meios de comunicação para tal atendimento, visando facilitar e ampliar o acesso das mulheres que necessitam do atendimento e reduzir aglomerações nos CREAS. Os canais de atendimento remoto devem ser amplamente divulgados, através do site da prefeitura, de cartazes nas unidades do SUAS e unidades públicas de outras políticas setoriais, envio de mensagens de texto em massa (se possível), dentre outros;

5.8. No contexto da pandemia, o órgão gestor da Assistência Social, em articulação com coordenadores dos CREAS, deve definir as atenções que poderão ser viabilizadas por meio remoto, considerando a realidade local. Tais atendimentos devem assegurar, no mínimo:

a) O fornecimento de orientações sobre acesso aos serviços e benefícios socioassistenciais;

b) O levantamento da necessidade de encaminhamento para acesso aos serviços de acolhimento ou alternativas de alojamentos emergenciais, quando for o caso;

c) A realização de cadastro e concessão de benefícios sociais.;

d) O monitoramento dos casos que estavam em acompanhamento no CREAS e oferta de atendimento psicossocial remoto, quando se mostrar viável e adequado.

5.9. No tocante ao atendimento psicossocial remoto de mulheres em situação de violência doméstica e familiar, é recomendado que os/as profissionais[1]:

a) Combinem previamente com as mulheres / famílias dias e horários para contato, mantendo uma rotina;

b) Somente realizem atendimentos psicológicos e sociais remotos sob prévia pactuação com a mulher, mediante estabelecimento de um plano de segurança individual, personalizado e prático, que garanta que a vítima tenha a privacidade necessária e esteja com condições seguras para o atendimento;

c) Passem a realizar atendimento individual remoto de vítimas que estavam sendo feitos de forma grupal, de modo a assegurar, na modalidade remota, o sigilo e a privacidade;

d) Priorizem o atendimento individual presencial nas situações em que o/a agressor/a esteja coabitando com a mulher; o/a usuário relate a precariedade de meios de Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs); e/ou situações de gravidade e complexidade que justifiquem o uso preferencial dessa modalidade de atendimento, mediante cautelosa avaliação profissional;

5.10. Havendo demanda no território e disponibilidade de meios de comunicação institucionais e de profissionais, os CREAS poderão disponibilizar números de telefones ou whatsapp emergenciais para os quais as mulheres possam ligar após o encerramento do horário de atendimento presencial, funcionando em modalidade de plantão;

5.11. Quando a equipe do PAEFI avaliar que seja necessária a realização de atendimento presencial, além dos cuidados com a prevenção de contágio, recomenda-se que a equipe realize uma triagem das mulheres atendidas, visando identificar a possível existência de sintomas como febre, tosse e dificuldade para respirar, se possível com aferição da temperatura corporal e encaminhamento aos serviços de saúde, quando for o caso;

5.12. Os atendimentos presenciais (individuais e/ou familiares) nos CREAS (ou unidades descentralizadas, se for o caso) devem ser realizados em ambientes amplos, arejados e constantemente limpos. Tal medida deve atentar para a garantia de sigilo e privacidade do atendimento, ainda que se opte por realizar os atendimentos em locais abertos (como varandas, quintais, tendas etc.);

5.13. As atividades coletivas e em grupos nos CREAS (ou unidades descentralizadas, se for o caso) devem ser suspensas;

5.14. Deve-se organizar uma escala de trabalho e revezamentos dos profissionais do PAEFI/CREAS, considerando a importância da oferta do serviço em horários estendidos (manhã, tarde e noite) e durante os fins de semana;

5.15. O número de equipes do PAEFI deve ser ampliado, podendo ser realocados profissionais de outros serviços que reduzirão ou suspenderão suas atividades;

5.16. As equipes do PAEFI/CREAS devem manter estreita articulação com as equipes dos serviços de acolhimento para mulheres em situação de violência doméstica e familiar, delegacias especializadas, sistema de justiça defensoria pública, e demais atores da Rede de Atendimento à Mulher em situação de Violência;

5.17. Nos casos de violência intrafamiliar ou em outras situações graves de violação de direitos devem ser verificados os encaminhamentos necessários que possibilitem a proteção da mulher (e filhos, se for o caso), incluindo a possibilidade de afastamento do agressor, o encaminhamento para serviço de acolhimento, dentre outros;

5.18. As equipes do PAEFI devem se articular às organizações e movimentos sociais que atuam na promoção e defesa dos direitos das mulheres e com demais serviços da rede de enfrentamento à violência contra as mulheres, a fim de apoiar e integrar o desenvolvimento de estratégias para melhorar a identificação dos casos de violência contra as mulheres, inclusive com a sensibilização da comunidade sobre o tema, aproveitando canais de comunicação alternativos, como carros de som.

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[1]Texto adaptado da Nota Técnica nº 02/2020 do Núcleo de Direitos Humanos e Coordenação do Psicossocial do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios.

6. MEDIDAS DESTINADAS AO FUNCIONAMENTO E CONTINUIDADE DA OFERTA DOS SERVIÇOS DE ACOLHIMENTO PARA MULHERES EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR

6.1. No contexto da pandemia, os serviços de Proteção Social Especial de Alta Complexidade são considerados essenciais, devendo-se assegurar sua continuidade, com atenção a medidas que proporcionem a ampliação das alternativas de acolhimento, mitigando riscos relacionados à transmissibilidade do vírus e apoiando a proteção, o distanciamento social e o isolamento, quando necessário.

6.2. Nesse sentido, providências de caráter emergencial precisam ser executadas pela gestão local do SUAS, em articulação com a gestão local do SUS, visando adaptar ou reorganizar unidades de acolhimento para mulheres vítimas de violência doméstica e familiar, observando medidas necessárias à segurança e saúde das acolhidas e dos profissionais, e avaliar se há necessidade de ampliação da oferta de acolhimento. Tais providências precisam alcançar a totalidade das unidades de acolhimento em cada localidade, incluindo os de natureza pública estatal e das organizações da sociedade civil, ainda que não recebam recursos públicos.

6.3. As orientações e recomendações apontadas neste tópico abordam as especificidades dos serviços de acolhimento para mulheres vítimas de violência doméstica familiar e complementam a Nota Pública do Ministério da Cidadania e do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, de 20 de março de 2020, que apresenta “Medidas de Prevenção ao Coronavírus nas Unidades de Acolhimento Institucional”, cujas recomendações também devem orientar a oferta dos serviços.

6.4. Diagnóstico

6.4.1. Para a tomada de decisão, planejamento das ofertas e definição de estratégias para proteger as mulheres em situação de violência doméstica e familiar, é fundamental que o órgão gestor da Assistência Social, em parceira com o Organismo Estadual de Políticas para as Mulheres[1]e demais atores da rede de proteção à mulher, realize um breve diagnóstico socioterritorial, incluindo:

a) o mapeamento da demanda de acolhimento em decorrência da COVID-19 (que poderá ter aumentado em função das questões abordadas anteriormente, que indicam o aumento da violência contra a mulher no contexto da pandemia);

b) avaliação da capacidade de atendimento e estrutura dos serviços de acolhimento para mulheres vítimas de violência doméstica e familiar existentes no município ou Distrito Federal.

6.4.2. O diagnóstico deve contemplar, dentre outras informações:

a) Rede de proteção à mulher disponível no território;

b) Quantitativo e caracterização da demanda por acolhimento de mulheres vítimas de violência doméstica e familiar;

c) Identificação e caracterização das unidades de acolhimento que atendam esse público;

d) Identificação da Unidade de Atenção Primária à Saúde (APS) de referência no território;

e) Capacidade de atendimento de cada unidade;

f) Quantitativo e caracterização dos trabalhadores que atuem em cada unidade, incluindo a informação de quais pertencem a grupos de risco à infecção pelo novo Coronavírus;

g) Estrutura física de cada unidade, contemplando, por exemplo, quantidade de quartos, quantitativo de acolhidos por quarto, quantidade de banheiros, espaço total (m²), se há espaços que possibilitem o isolamento adequado de casos suspeitos ou confirmados de infecção pelo novo Coronavírus;

h) Quantitativo e perfil dos acolhidos em cada unidade: quantidade de mulheres sozinhas, quantidade de mulheres com filhos (número e idade das crianças e adolescentes que compõem cada núcleo familiar), se há pessoas com deficiência ou pertencente a grupos de risco à infecção pelo novo Coronavírus, dentre outras informações relevantes;

i) Identificação dos serviços de acolhimento que precisarão ser reorganizados e quais adequações serão necessárias para reduzir aglomeração e mitigar riscos;

j) Identificação da necessidade, ou não, de aumento de vagas de acolhimento e de implantação de novas respostas para garantir a oferta do atendimento necessário e a segurança das acolhidas, diante do aumento de demanda durante a pandemia.

6.4.3. O diagnóstico deve apontar para estratégias de reorganização da rede existente, visando a realização de ações coordenadas para a absorção da nova demanda e a realização das adequações descritas no presente documento. Devem ser identificadas as unidades de acolhimento que necessitam de readequações e estabelecidas as modalidades de acolhimento provisório que serão utilizadas para atender a demanda reprimida.

6.4.4. Considerando os achados do diagnóstico realizado, o órgão gestor da Assistência Social devem mapear os principais riscos, elaborar em conjunto com cada unidade de acolhimento planos de contingência e coordenar as ações de readequação das unidades já existentes, ou outros arranjos locais que se mostrem mais benéficos.

6.4.5. Cabe destacar que na elaboração do planejamento das ações é preciso considerar que as unidades de acolhimento para mulheres em situação de violência doméstica e familiar possuem localização sigilosa, pois acolhem mulheres e/ou seus grupos familiares que estão sob medida protetiva judicial em função de ameaça e/ou risco de morte. Assim, qualquer ação a ser adotada pelo gestor da Assistência Social deve ser realizada em parceria com os Organismos de Políticas para as Mulheres e orientada por essa particularidade do serviço, sem o qual não será possível garantir a adequada proteção dessas mulheres no espaço institucional.

6.4.6. Deve ser dada especial atenção, ainda, ao fato de que, conforme aponta os dados do Censo SUAS 2018, um número significativo de mulheres em situação de violência doméstica e familiar são acolhidas junto com seus filhos. Assim, as ações devem ser planejadas também com vistas à garantia da proteção integral de tais crianças e adolescentes, em consonância com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). A presença de crianças e adolescentes deve ser levada em consideração na escolha da melhor modalidade de acolhimento a ser ofertada ao grupo familiar, assim como ao espaço físico que será utilizado, de modo a permitir a convivência entre mãe e filhos, sua proteção e, na medida do possível, a privacidade desse núcleo familiar.

6.5. Reorganização das Unidades de Acolhimento existentes

6.5.1. As unidades de acolhimento para mulheres vítimas de violência doméstica e familiar existentes nos territórios deverão continuar a ofertar o serviço, devendo, entretanto, reorganizar espaços e procedimentos, realizando as adequações necessárias à mitigação dos riscos de transmissibilidade do novo Coronavírus, de modo a proteger a saúde de usuários e profissionais dos serviços. No contexto da pandemia, alguns dos principais riscos a ser mitigados nas unidades de acolhimento são a aglomeração de pessoas e o fluxo de entrada e saída nas unidades.

6.5.2. Nesse sentido, devem ser pensadas alternativas para a reorganização e separação dos cômodos, visando reduzir ao máximo o contato entre as acolhidas e os grupos familiares, principalmente no que se refere à utilização de áreas comuns e objetos de uso coletivo.

6.5.3. As acomodações devem guardar a distância mínima de 1 metro, de preferência 2 metros, entre as camas, na medida do possível, e o número de pessoas por quarto deve ser reduzido para que um número menor de pessoas compartilhe o mesmo ambiente. Preferencialmente, cada quarto deve ser utilizado por no máximo 4 pessoas (salvo se for grupo familiar de mãe e filhos – que devem permanecer juntos no mesmo quarto).

6.5.4. O mesmo deve ser pensado com relação aos banheiros, os quais devem ser compartilhados somente por um número reduzido de pessoas, preferencialmente por aquelas que dividem o mesmo dormitório. Quando isso não for possível, deve haver separação de grupos de acolhidas para que utilizem sempre o mesmo banheiro, reduzindo assim as possibilidades de contaminação ocasionada por portadores assintomáticos da Covid-19.

6.5.5. Assim, além das orientações contidas na Nota Pública MC/MMFDH sobre “Medidas de Prevenção ao Coronavírus nas Unidades de Acolhimento Institucional”, devem ser levadas em consideração as recomendações a seguir.

6.6. Recomendações gerais para dirigentes das unidades de acolhimento para prevenção da transmissibilidade do novo Coronavírus (COVID-19)

a) Apoiar o deslocamento dos profissionais que atuam na unidade: avaliar possibilidade de assegurar transporte específico para o deslocamento dos profissionais, de modo a evitar o uso de transporte público e minimizar riscos de contaminação;

b) Organizar a equipe de modo a reduzir para o menor número possível a quantidade de profissionais em contato direto com as pessoas acolhidas;

c) Definir profissionais específicos para o cuidado de pessoas com suspeita ou confirmação de contaminação pelo novo Coronavírus, garantindo meios para sua proteção;

d) Reorganizar o espaço físico da unidade, de modo a reduzir o número de pessoas em cada acomodação, pensando alternativas para a reorganização e separação dos quartos, visando diminuir ao máximo o contato físico entre os acolhidos e respeitar o distanciamento já indicado entre as camas, quando possível, e conforme orientado nos tópicos acima;

e) Organizar as camas de modo que fiquem o mais distante possível – pelo menos 1 metro de distância entre camas (idealmente 2 metros);

f) Informar trabalhadores e acolhidas a respeito das medidas de prevenção e mitigação de riscos que precisam ser adotadas neste momento de pandemia;

g) Implementar procedimentos de avaliação para a admissão de novas acolhidas e adotar isolamento nos primeiros 14 dias após o acolhimento;

h) Restringir saídas desnecessárias das acolhidas dos grupos de risco, evitando-se ao máximo fluxos de entrada e saída de pessoas na unidade;

i) Estabelecer rotinas de higiene e avaliação na entrada dos trabalhadores e usuárias na unidade: higienização e medição da temperatura corporal ao chegar; breve entrevista para verificar estado de saúde, se houve contato com pessoas que apresentavam sintomas de gripe, se há sintomas que possam estar associados à contaminação pelo novo Coronavírus, afastando imediatamente das funções os trabalhadores que apresentarem sinais e sintomas compatíveis com síndrome gripal e orientá-los quanto à testagem para COVID-19;

j) Restringir o compartilhamento de espaços, na medida do possível. Organizar e coordenar a utilização dos espaços comuns da unidade, quando o compartilhamento for indispensável (refeitórios, áreas de lazer, sala de televisão, dentre outros). Estabelecer horários de permanência diferentes para cada grupo de pessoas, reduzindo o número de pessoas concomitantemente no mesmo espaço, com a distância recomendada mínima de 1 metro entre as pessoas (esta distância pode ser desconsiderada quando se tratar de mães e filhos). Adotar rotina de limpeza e higienização sistemática destes locais com álcool à 70% ou solução de hipoclorito a 10% nos intervalos entre usos, incluindo mesas e cadeiras;

k) Orientar para que as refeições sejam servidas, de preferência, nos quartos das acolhidas, quando possível, ou para escalonar o horário das refeições;

l) Identificar possíveis riscos referentes à pandemia diante da realidade local e das especificidades da unidade e de seus acolhidos e elaborar, em parceria com a gestão local da política de Assistência Social e da Saúde, Plano (s) de Contingência voltados à mitigar os efeitos da ocorrência dos riscos identificados;

m) Identificar de forma precoce e comunicar-se com o órgão gestor da Assistência Social quando houver necessidade de remanejamento de profissionais para recomposição da força de trabalho;

n) Adotar medidas que possam contribuir para a redução de fluxos diários de entradas e saídas de profissionais, como por exemplo, trabalho remoto para profissionais da área administrativa; escalas de revezamento e redução de atividades ao extremamente necessário em áreas como lavanderia e cozinha; realização de supervisões ou reuniões de equipe por meios remotos, etc;

o) Identificar, quantificar e adquirir, em articulação com os órgãos gestores da Assistência Social, Equipamentos de Proteção individual (EPI) – máscaras, óculos protetores, aventais, álcool gel e similares – que se fizerem necessários para o desempenho das funções pelas equipes;

p) Orientar a equipe quanto ao uso dos EPI e demais medidas e procedimentos necessários para mitigar riscos e prevenir a transmissibilidade do novo Coronavírus, em articulação com os órgãos gestores da Assistência Social e da Saúde;

q) Adotar logística para entrega de alimentos e outros suprimentos diretamente na unidade de acolhimento, de modo a atender as demandas do serviço sem exigir deslocamento da equipe para fazer compras, adotando procedimentos para higienização dos produtos que chegarem à unidade, de modo a diminuir os riscos de transmissibilidade do vírus;

r) Comunicar-se permanentemente com a área de Saúde local, de acordo com os fluxos acordados entre os órgãos gestores da Assistência Social e da Saúde, além de comunicação imediata de situações de suspeita de infecção pelo novo Coronavírus;

6.7. Recomendação para os profissionais que atuam nas unidades

a) Ao chegar à unidade de acolhimento, os profissionais deverão trocar a roupa e o calçado usados no trajeto e lavar bem mãos, braços e rosto (caso haja estrutura para tal, recomenda-se tomar banho ao chegar);

b) Usar máscaras e luvas ao manipular alimentos;

c) Usar máscara cirúrgica durante o contato direto com acolhidas;

d) Os profissionais que tenham contato com acolhidas com suspeita ou confirmação de contaminação devem utilizar EPI adequadas, de acordo com orientações das autoridades sanitárias;

e) Lavar as mãos com água e sabão várias vezes ao dia e fazer uso de álcool em gel a 70% para higienizar as mãos sempre que necessário;

f) Monitorar diariamente as acolhidas quanto à febre, sintomas respiratórios e outros sinais e sintomas de síndrome gripal;

g) Evitar, nas atividades diárias, o uso de ambientes fechados com pouca ventilação;

h) Disponibilizar informações sobre a importância do distanciamento social e os cuidados com a higiene, e apoiar as acolhidas que estejam com seus filhos a passarem tais informações para as crianças, de forma didática e lúdica.

6.8. Manejo de novos acolhimentos e de casos suspeitos ou confirmados de contaminação pelo novo Coronavírus (COVID-19)

6.8.1. Sempre que possível, deve-se separar locais específicos para atendimento de cada umas das seguintes situações: (i). novas acolhidas – que devem ficar em espaços específicos durante 14 (quatorze) dias após a chegada; (ii). Acolhidas com suspeita de contaminação; (iii). Acolhidas com confirmação de contaminação.

6.8.2. As opções de remanejamento deverão ser avaliadas para esses casos, considerando se é possível assegurar nesses espaços o adequado isolamento das pessoas com suspeita ou confirmação do contágio, prevenindo a transmissibilidade do vírus entre as demais acolhidas.

6.8.3. Os profissionais das unidades de acolhimento institucional, assim como os profissionais que acompanham as acolhidas nas demais modalidades de acolhimento (moradia provisória e acomodação na rede hoteleira) devem acompanhar de forma criteriosa possíveis mudanças na condição de saúde das acolhidas, atentando-se para o início de sintomas que possam estar relacionados à contaminação pelo novo Coronavírus.

6.8.4. Em caso de sintomas que possam indicar contaminação, os profissionais devem providenciar o imediato isolamento da pessoa, suspendendo o contato com as demais, ligar para o numero 136 – serviço TeleSUS do Ministério da Saúde para orientações e comunicar imediatamente à unidade de referência da Atenção Primária à Saúde, de modo a assegurar as medidas necessárias para proteção de todos. Nessas situações, devem-se seguir rigorosamente as orientações da Saúde, considerando os fluxos previamente pactuados para comunicação e atendimento desses casos, além de procedimentos para isolamento.

6.8.5. Nas situações de suspeita ou confirmação de contaminação, assim como nas situações de chegada de nova acolhida durante o período de pandemia, deve-se seguir as seguintes medidas:

a) Acomodação em quarto individual com ventilação adequada e banheiro diferenciado dos demais, sendo assegurado seu isolamento, evitando-se a utilização dos espaços comuns;

b) Caso precise sair do quarto para procedimentos médicos, uso de áreas comuns, ou outras atividades, a acolhida com suspeita ou confirmação de COVID-19 deverá ser orientada a sempre utilizar máscara cirúrgica e adotar as medidas padrão de controle, incluindo o ajuste de rotinas para evitar o contato presencial com as demais acolhidas;

c) As refeições deverão ser levadas no quarto pela equipe do serviço;

d) A limpeza do quarto e do banheiro deverá ser executada pela própria acolhida, com material fornecido pelo serviço, para evitar entrada e saída de trabalhadores no ambiente e prevenir a transmissibilidade;

e) As acolhidas devem ser levadas ao ar livre ou a outros espaços em períodos diferentes das demais acolhidas;

f) Quando da desocupação do quarto de isolamento, o mesmo deverá ser devidamente higienizado e desinfetado com água sanitária.

g) Necessidade de seguir rigorosamente todas as orientações de procedimentos relativos ao uso de EPI e cuidados no contato com a pessoa com suspeita ou confirmação de contaminação, descarte de lixo, higienização de roupas e objetos, dentre outras recomendações das autoridades sanitárias;

h) Separação do vestuário e roupas de cama e banho usadas pela pessoa com suspeita ou confirmação de contágio, para que sejam higienizadas à parte. Caso não haja a possibilidade de fazer a lavagem das roupas imediatamente, armazená-las em sacos de lixo plástico até que seja possível lavar. Devem ser separados o lixo produzido, toalhas de banho, garfos, facas, colheres, pratos, copos, dentre outros objetos de uso pessoal. Sofás e cadeiras não devem ser compartilhados;

i) Reforço das medidas de higiene pelas acolhidas e pelo(s) profissional(is) com os quais venha a ter contato.

6.8.6. Além das recomendações acima, quando existir suspeita ou confirmação de infecção pelo Coronavírus entre acolhidas deve-se, ainda, atentar para os seguintes procedimentos:

a) Proporcionar cuidados mais sistemáticos, apoio e suporte à acolhida;

b) Possibilitar repouso, hidratação e alimentação adequada;

c) Monitorar suas condições de saúde constantemente por profissional treinado;

d) Conduzir a serviço de urgência/emergência de referência nos casos de piora dos sintomas e condição de saúde, como dificuldade respiratória. Durante o transporte, devem ser usados Equipamentos de Proteção Individual.

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[1]Vide lista dos OPMs na página da Secretaria Nacional de Políticas para as Mulheres, do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos.

7. OUTRAS OFERTAS PARA ATENDER ÀS NECESSIDADES DE ACOLHIMENTO DAS MULHERES EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR

7.1. Considerando que a oferta de vagas nos serviços de acolhimento existentes na rede pode não ser suficiente para atender a demanda decorrente da situação de emergência e das necessidades de reorganização dos espaços físicos, com consequente necessidade de realocação das acolhidas, os órgãos gestores de Assistência Social deverão coordenar ações visando à oferta de outras alternativas para o acolhimento emergencial das mulheres em situação de violência doméstica e familiar que necessitem do serviço, especialmente durante o período da pandemia. Para tanto, sugere-se:

a) Implantação emergencial de novas unidades de acolhimento institucional;

b) Utilização de moradias provisórias;

c) Utilização da rede hoteleira.

7.2. Para a definição de quais ofertas de acomodação serão disponibilizadas, deverão ser consideradas as indicações obtidas a partir do Diagnóstico Socioterritorial das Unidades de Acolhimento. Alternativas mais adequadas para cada caso devem ser avaliadas, se possível, com a participação das usuárias, resguardando o total sigilo de sua localização.

7.3. Recomenda-se que as mulheres que estejam nos grupos considerados de risco à infecção pelo novo Coronavírus e aquelas que estejam acompanhadas de filhos sejam, prioritariamente, acolhidas em modalidades de alojamento que possibilitem maiores condições para o distanciamento social, como moradia provisória ou hospedagem na rede hoteleira.

7.4. É importante ressaltar que a inclusão das usuárias nas modalidades que impliquem sua maior autonomia não exime o poder público de garantir ofertas para satisfação de suas necessidades básicas e de disponibilizar as medidas de proteção necessárias e acompanhamento técnico, além de informações e cuidados necessários para que possam se proteger adequadamente da transmissibilidade do novo Coronavírus.

7.5. Em todos os casos de oferta de acolhimento tratados neste documento poderão ser utilizados os recursos voltados ao enfrentamento da emergência de saúde pública decorrente da COVID-19, previstos na MP nº 953, de 15 de abril de 2020, observadas as regulamentações específicas, especialmente a Portaria MC nº 369 de 29 de abril de 2020. Tais recursos também poderão ser utilizados para apoiar outras formas de acolhimento que sejam adequadas à realidade local, desde que resguardem a segurança à saúde de usuários e trabalhadores, em conformidade com recomendações das autoridades sanitárias.

7.6. Implantação Emergencial de Novas Unidades de Acolhimento Institucional

7.6.1. Organização Emergencial de Novas Unidades de Acolhimentos para pequenos grupos, preferencialmente de até 10 (dez) acolhidas. A organização de serviços de acolhimento para pequenos grupos poderá ser adotada como alternativa para:

a) atender novas demandas de inclusão em serviço de acolhimento durante o período de pandemia;

b) assegurar o adequado isolamento social em casos de suspeita ou confirmação de contágio com Coronavírus, que não exijam hospitalização;

c) remanejar mulheres acolhidas em unidades de acolhimento preexistentes, como medida de caráter emergencial para reduzir a aglomeração em tais unidades, com o objetivo mitigar riscos de transmissibilidade.

7.6.2. A implantação de novas unidades implica na organização de infraestrutura, incluindo: aluguel ou cessão de imóvel (preferencialmente casas), disponibilização de profissionais para atuar na nova unidade (podendo-se para tal utilizar tanto o remanejamento de profissionais de outros serviços como a contratação temporária), mobiliário, utensílios, roupas de cama, banho e outros itens necessários, além de itens de uso pessoal das acolhidas.

7.6.3. A organização do espaço físico das unidades emergenciais deve seguir os mesmos parâmetros estabelecidos neste documento para as adequações que serão realizadas nas unidades já existentes.

7.6.4. Destaca-se a importância de se manter uma equipe profissional em número adequado à demanda no sentido de garantir a qualidade do atendimento às acolhidas, tendo em vista que essa é uma situação atípica da qual podem emergir demandas que precisarão de suporte e atenção diferenciada. Ressalta-se também que pode haver necessidade de aumentar a quantidade de profissionais para higienização e limpeza dos ambientes.

7.7. Utilização de moradias provisórias

7.7.1. Uma alternativa para atender a demanda de acolhimento decorrente da pandemia da Covid-19 é a acomodação das mulheres e seus filhos, quando for o caso, em moradias provisórias, o que poderá ocorrer por meio da:

a) Oferta de recursos em pecúnia que possibilitem às mulheres alugarem de forma autônoma moradia temporária;

b) Locação temporária pelo poder público de moradia que atenda a necessidade emergencial das mulheres e suas famílias.

7.7.2. Trata-se de moradia subsidiada pelo poder público e para sua organização é importante:

a) Estabelecer profissional para a gestão e equipe técnica de referência para acompanhamento psicossocial e orientação das usuárias, articulação com a rede de proteção, encaminhamento para outros serviços, programas e benefícios da rede socioassistencial e das demais políticas públicas;

b) Observar a necessidade de assegurar proteção às usuárias e o caráter sigiloso da permanência destas em tais locais;

c) Quando necessário, assegurar alimentação e demais itens básicos, como produtos para higiene, em quantidade suficiente, além de mobiliário, utensílios, roupas de cama, banho e outros itens necessários;

d) Estabelecer canais de comunicação com a Saúde e fluxos de encaminhamentos em caso de demandas de saúde – acesso a medicamentos, continuidade de tratamentos e cuidados relacionados à COVID-19;

e) Seguir, no que couber, as demais recomendações para as unidades de acolhimento já existentes previstas nesta Nota Técnica.

7.8. Utilização da rede hoteleira

7.8.1. A utilização da rede hoteleira para remanejamento de parte das acolhidas em serviços de acolhimento institucional ou acomodação de novas mulheres que necessitem de acolhimento durante a pandemia também poderá ser considerada como uma alternativa neste cenário. Também nessa modalidade deve ser assegurada a proteção das usuárias e o caráter sigiloso da sua permanência em tais locais.

7.8.2. Para oferta dessa modalidade de acolhida é importante:

a) Garantir a permanência nas instalações dos hotéis de profissionais do SUAS para o atendimento das mulheres acolhidas, de modo a garantir o acompanhamento psicossocial, a proteção e os encaminhamentos necessários;

b) Destinar hotéis específicos para o isolamento de acolhidas em quarentena devido à suspeita ou confirmação de COVID-19 ou, na sua impossibilidade, separação de alas ou andares exclusivamente para tal finalidade, evitando, sobretudo nestes casos, o trânsito de pessoas entre os ambientes;

c) Respeitar orientações referentes à não aglomeração de pessoas, distanciamento de, pelo menos, 1 metro[1]entre pessoas, fornecimento de refeições individuais (preferencialmente servidas nos quartos, não sendo permitido o uso de buffets), reforço nos hábitos de higiene, testagem de temperatura, dentre outros que visem o cumprimento das medidas sanitárias necessárias à prevenção da COVID-19.

7.8.3. Para viabilizar esse arranjo, orienta-se que o órgão gestor da Assistência Social, coordene a articulação e possíveis contratos com a rede hoteleira local. Nesse sentido, orienta-se que os gestores locais levem em consideração alguns aspectos relevantes para a contratação de hotéis, devendo-se verificar as suas instalações e se a estrutura é suficiente e está em bom estado, observando, ainda, se atendem às seguintes condições: instalações, de preferência, com boa ventilação natural, ou, se utilizarem apenas refrigeração por equipamento de ar condicionado, que estes tenham a devida manutenção e limpeza; dar preferência aos que disponham de banheiro dentro do quarto, necessário para garantir a medida de distanciamento social e a prevenção à transmissibilidade do vírus.

7.8.4. Principalmente nos casos de acolhimento na rede hoteleira de pessoas com sintomas ou confirmação de COVID-19 que não necessitem de hospitalização, deve haver uma articulação com a unidade de Atenção Primária à Saúde (APS) de referência no território, possibilitando o monitoramento pela equipe de saúde, de modo a prestar as orientações necessárias e identificar as necessidades de suportes e apoios em saúde que surgirem.

7.8.5. Deve-se assegurar, ainda, que, caso alguma acolhida apresente algum sintoma gripal, seja possível agir rapidamente, entrando em contato com o número 136 (serviço TeleSUS do Ministério da Saúde) ou com equipe da Atenção Primária à Saúde de referência no território.

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[1]Distância de, pelo menos, 1 metro. Desejável 2 metros.

8. OUTRAS QUESTÕES RELEVANTES

8.1. No caso das mulheres em situação de violência doméstica e familiar, verifica-se que a maioria trabalha na economia informal, sem fonte de renda segura. Na preparação para o desligamento da unidade, deve-se assegurar que esta terá suporte e apoio necessário também para a busca de autonomia financeira e inserção no mundo do trabalho, inclusão em programas habitacionais, quando for o caso, além de inclusão em programas de transferência de renda e benefícios socioassistenciais, sempre que necessário. Desse modo, destaca-se que o desligamento não deverá ser compulsório, motivado apenas pelo tempo de permanência na unidade, sendo necessária a construção de possibilidades e alternativas em conjunto com a mulher acolhida que a possibilite manter-se por conta própria, com dignidade e segurança, fora do serviço de acolhimento.

8.2. Neste sentido, é importante mencionar as Diretrizes de Abrigamento às Mulheres em situação de violência (2011), que preveem o acompanhamento pós-acolhimento das mulheres por serviços da rede de atendimento (CREAS, CRAMs, Rondas/Patrulhas da Lei Maria da Penha, dentre outros), em virtude da complexidade do fenômeno que não se esgota com o acolhimento.

9. DOCUMENTOS RELACIONADOS

9.1. Brasil. Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020. Dispõe sobre as medidas para enfrentamento da Emergência em Saúde Pública de Importância Internacional decorrente do novo Coronavírus, responsável pelo surto de 2019. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/lei/L13979.htm.

9.2. Brasil. Decreto Legislativo nº 6, de 18 de março de 2020. Reconhece a situação de calamidade pública no país. Disponível em: https://legis.senado.leg.br/norma/31993957/publicacao/31994188.

9.3. Brasil. Decreto nº 10.282, de 20 de março de 2020. Regulamenta a Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, para definir os serviços e atividades essenciais. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/decreto/D10282.htm.

9.4. Brasil. Medida Provisória nº 953, de 15 de abril de 2020. Abre crédito extraordinário em favor do Ministério da Cidadania, no valor de R$ 2.550.000.000,00, para o fim que especifica. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2020/Mpv/mpv953.htm.

9.5. Brasil. Ministério da Cidadania. Portaria nº 337, de 24 de março de 2020. Dispõe acerca de medidas para o enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus, COVID-19, no âmbito da rede socioassistencial, pública e privada, do Sistema Único de Assistência Social. Disponível em: http://blog.mds.gov.br/redesuas/portaria-no-337-de-24-de-marco-de-2020/.

9.6. Brasil. Ministério da Cidadania. Secretaria Nacional de Assistência Social. Portaria nº 54, de 1º de abril de 2020. Aprova recomendações gerais aos gestores e trabalhadores do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) dos Estados, Municípios e do Distrito Federal com o objetivo de garantir a continuidade da oferta de serviços e atividades essenciais da Assistência Social, com medidas e condições que garantam a segurança e a saúde dos usuários e profissionais do SUAS. Disponível em: http://www.in.gov.br/web/dou/-/portaria-n-54-de-1-de-abril-de-2020-250849730.

9.7. Brasil. Ministério da Cidadania. Secretaria Nacional de Assistência Social e Secretaria de Gestão de Fundos e Transferências. Portaria Conjunta SNAS/SEDS e SGFT nº 1, de 2 de abril de 2020. Dispõe acerca da utilização de recursos do Cofinanciamento Federal no atendimento às demandas emergenciais de enfrentamento ao Coronavírus (Covid-19) no âmbito do Sistema Único de Assistência Social. Disponível em: http://www.in.gov.br/en/web/dou/-/portaria-conjunta-n-1-de-2-de-abril-de-2020-251067584.

9.8. Brasil. Ministério da Cidadania. Portaria nº 58, de 15 de abril de 2020. Aprova a Nota Técnica nº 20/2020, que traz orientações gerais acerca da regulamentação, gestão e oferta de benefícios eventuais no contexto de enfrentamento aos impactos da pandemia da COVID-19, causada pelo novo Coronavírus, no âmbito do Sistema Único de Assistência Social (SUAS). Disponível em: http://www.in.gov.br/en/web/dou/-/portaria-n-58-de-15-de-abril-de-2020-252722843.

9.9. Brasil. Ministério da Cidadania. Portaria nº 369, de 29 de abril de 2020. Dispõe sobre o repasse financeiro emergencial de recursos federais para a execução de ações socioassistenciais e estruturação da rede do Sistema Único de Assistência Social – SUAS, no âmbito dos estados, Distrito Federal e municípios devido à situação de Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional – ESPIN, em decorrência de infecção humana pelo novo coronavírus, Covid-19. Disponível em: portaria-369-repasse-financeiro-emergencial-suas.

9.10. Brasil. Ministério da Cidadania. Portaria nº 378, de 7 de maio de 2020. Dispõe sobre repasse de recurso extraordinário do financiamento federal do Sistema Único de Assistência Social para incremento temporário na execução de ações socioassistenciais nos estados, Distrito Federal e municípios devido à situação de Emergência em Saúde Pública de Importância Internacional decorrente do coronavírus, COVID-19. Disponível em: http://blog.mds.gov.br/redesuas/portaria-378-recursos-para-incremento-temporario-de-acoes-do-suas/.

9.11. BRASIL. Ministério da Cidadania. “Orientações Técnicas sobre Benefícios Eventuais no SUAS”. Disponível em: http://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/Cadernos/PB022-0519_SNAS_Benefi%CC%81cios%20Eventuais.pdf.

9.12. Brasil. Ministério da Cidadania e Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. NOTA PÚBLICA Medidas de Prevenção ao Coronavírus nas Unidades de Acolhimento Institucional, de 20 de março de 2020. Disponível em: http://blog.mds.gov.br/redesuas/nota-publica-medidas-de-prevencao-ao-coronavirus-nas-unidades-de-acolhimento-institucional/.

9.13. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 454, de 20 de março de 2020. Declara, em todo o território nacional, o estado de transmissão comunitária do coronavírus (covid-19). Disponível em: http://legislacao.planalto.gov.br/legisla/legislacao.nsf/Viw_Identificacao/PRT%20454-2020?OpenDocument.

9.14. Brasil. Ministério da Saúde: www.saude.gov.br/coronavirus.

9.15. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 188, de 04 de fevereiro de 2020. declara Situação de Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional (ESPIN). Disponível em: https://portalarquivos.saude.gov.br/images/pdf/2020/April/03/Portarias-publicadas-sobre-COVID.pdf.

9.16. Brasil. Ministério da Saúde. Nota Técnica DESF/SAPS/MS nº 11/2020. Disponível em: https://egestorab.saude.gov.br/image/?file=20200415_N_Notatecnican11_4894830053350721636.pdf.

9.17. Brasil. Ministério da Saúde/FIOCRUZ. Saúde mental e atenção psicossocial na pandemia COVID-19. Violência doméstica e familiar na COVID-19. Disponível em:https://portal.fiocruz.br/sites/portal.fiocruz.br/files/documentos/saude-mental-e-atencao-psicossocial-na-pandemia-covid-19-violencia-domestica-e-familiar-na-covid-19.pdf.

9.18. Brasil. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Orientações Gerais – Máscaras faciais de uso não profissional. Brasília, ANVISA, 2020. Disponível em:https://coronavirus.saude.gov.br/profissional-gestor#protocolos

9.19. Brasil. Ministério do Trabalho e Emprego. NORMA REGULAMENTADORA 32 (NR 32) para segurança e saúde no trabalho em serviços de saúde. Disponível em http://trabalho.gov.br/images/Documentos/SST/NR/NR32.pdf.

9.20. BRASIL. Secretaria Nacional de Políticas para as Mulheres/Secretaria Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres. Diretrizes Nacionais para o Abrigamento de Mulheres em situação de Risco e de Violência. Brasília: 2011. Disponível em: https://www12.senado.leg.br/institucional/omv/entenda-a-violencia/pdfs/diretrizes-nacionais-para-o-abrigamento-de-mulheres-em-situacao-de-risco-e-de-violencia.

9.21. BRASIL. Secretaria Nacional de Políticas para as Mulheres: https://www.gov.br/mdh/pt-br/navegue-por-temas/politicas-para-mulheres.

9.22. Comitê Permanente Interagências (IASC). Guia: Como lidar com os aspectos psicossociais e de saúde mental referentes ao surto de covid-19, Versão 1.5, Março 2020.

9.23. Organização Mundial de Saúde. Declaração de Emergência em Saúde Pública Internacional. Genebra, 30 de janeiro de 2020. Disponível em: https://nacoesunidas.org/oms-declara-coronavirus-emergencia-de-saude-publica-internacional/

9.24. ONU Mulheres. Gênero e COVID-19 na América Latina e no Caribe: dimensões de gênero na resposta da ONU Mulheres, de março de 2020. Disponível em: http://www.onumulheres.org.br/wp-content/uploads/2020/03/ONU-MULHERES-COVID19_LAC.pdf

9.25. UNIFESP. Brasil é o 5° país que mata mais mulheres. Disponível em: https://www.unifesp.br/reitoria/dci/publicacoes/entreteses/item/2589-brasil-e-o-5-pais-que-mais-mata-mulheres

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