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A empatia como ideal de justiça equânime

Autor: Laurentino Lúcio Filho

Data de produção: 04/5/2023

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O presente trabalho traz como proposta a atualização da dialética que é usada como ferramenta base na solução dos litígios sob a forma de debates em diálogos, contudo, podendo se revelar nos dias de hoje, sem eficácia à realização da Justiça.

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Para compreendermos a aplicação inadequada do diálogo na solução do conflito, ou, na pretensão resistida (lide), partimos do pressuposto da obra de Maturana e Varela (2013) que afirma que “não se pode ter a certeza do certo”, com isso, a prestação jurisdicional que é executada sobre  petição do Autor, e, sobre a contestação do Requerido não revela a equidade na Justiça, porque é produzida sob a convicção da certeza dos fatos e provas (livre convencimento do juiz motivado nas provas) que é incerto.

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Por isso, é grande o risco de se apresentar viciada pelo sofisma estatal ao proclamar por sentença “ser o certo”, pois, se o mérito foi prolatado como certeza do certo, logo se conclui que não houve a equidade ou Justiça, pois, a tutela judicial sob o ideal de certeza acolheu a pretensão de um polo como certo, e, excluiu o outro como condenável, limitando com isso o universo da realidade jurídica e ferindo a dignidade humana sub-julgada como inconformismo do perdedor.

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Assim, se o mérito não deve se pautar pela certeza do certo, pois, revela diante da moderna linguagem o excesso de judicialização das relações sociais, com a ineficácia dos caminhos da Justiça real, deve se pautar o interesse privado pela experiência que constituiu o Estado, evitando-se a tutela jurisdicional pautada na linha de que Direito significa o certo, e, fora dele, o errado.

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Sob esse modelo de erro e acerto para a realização da Justiça, a balança não se equilibra, pois, vai incluir uma parte, sob o título de procedência de certo, mesmo que a realidade revele errada, ao mesmo tempo que precisa excluir a outra sob o título de improcedente, mesmo que a realidade revele certo. Como que, para salvar um, se precisa eliminar ou, matar o outro, assemelhando a jurisdição à um permanente estado de necessidade, que nos parece imitar as irracionais disputas mortais do autoritarismo entre os animais da mesma espécie que se valem da exclusão para impor os domínios sobre seus territórios.

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Por isso, parece que a dialética não se revela adequada à prestação jurisdicional a partir da defesa de teses por debates (antítese ativo x antítese passivo = síntese ou sentença), porque a síntese, ou sentença, se revelará, sem equilíbrio, pesando apenas para um lado da balança, por se nortear somente pelo rito ilusório de se estar fazendo o certo e banindo-se o errado.

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Isso ocorre na tutela judicial porque tanto o ideal do certo como o do errado embora sendo incertos, no convencimento judicial são minimizados ante à complexidade da realidade jurídica pela simples equação do erro-acerto, com isso, despreza-se na prestação jurisdicional, a alta complexidade da sociabilidade harmônica do Direito, para limitá-la a dois polos, como se fosse um código binário de 0 (passivo) e 1 (ativo), ou mesmo, a estratégia do acertar pela exclusão do erro.

Este modelo diante se mostra aquém do Direito desenvolvido, ineficaz, arcaico. Pois, revela os mesmos vícios dos autoritarismos da idade média promovidos por seus ditadores imperiais e feudais, ou, até mesmo, retroagindo-se a tábuas de Hamurabi.

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Assim, ao se falar do Direito como desenvolvimento humano, nos tempos atuais a sua eficácia significa afastar a prestação jurisdicional da limitada minimização dada pela  codificação 0x1, ou, certo-errado, inocente-condenado, afastando-se da sentença de conformismo sem  harmonia pacífica, para emergir em seu lugar a prestação jurisdicional sob o alicerce do horizonte que norteia a Ética Jurídica, no lugar do debate, se promover o compartilhamento das experiência próprias de cada parte na efetivação da justiça, amplificando-se a empatia pessoal através da interação, para a empatia existencial.

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Ou seja, a empatia que vai além do ser vem como, para se integrar ao propósito comum da experiência das partes na edificação do bem comum que norteia a base do Estado Democrático, quebrando celeumas do que é o certo para um e errado para o outro, já que ambas as partes se vêm procedendo dentro do certo.

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Pela empatia existencial a pretensão não é a de um direito individual, mas de um direito harmônico que é interesse natural das duas partes do quanto cada uma contribui para a comunhão de uma vida compartilhada, sob o princípio democrático, cujo resultado é o crescimento do bem comum daquela sociedade.

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Com isso, se afastaria da prestação jurisdicional o efeito segregador da prática de se escolher o certo diante do  banimento do errado, uma vez que a equidade da Justiça se alcançaria pelo esforço mútuo de cada um em contribuir com o melhor para o meio, ao invés de disputar seu interesse econômicos individuais, construindo-se a cognição pelo esforço mútuo a renovação da experiência coletiva (constitucional) que favoreceu o bem comum, como se em cada provimento jurisdicional, o Direito fosse se renovando pelo interesse comum na harmonia social, imitando-se qualquer sistema orgânico vivo que se desenvolve na autopoiese.

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Esta proposta de equidade não é uma novidade no Direito, já que já foi revelada ao homem, há 2.000 anos atrás, quando Jesus Cristo propôs a comunhão de pessoas, inspirando o ideal do Estado de Direito de formar pela comunhão de cidadãos um só povo.

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Referência

MATURANA, Humberto R. VARELA, Francisco J.  A árvore do conhecimento: as vases biológicas da compreensão humana. São Paulo, Palas Athena, 9ª Ed. 2011.

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Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da AASP.

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Laurentino Lúcio Filho

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Minibio: Advogado desde 1994, mestre em Semiótica Cognitiva – Percepção pela PUC-SP, especialista em Direito Empresarial – Universidade Mackenzie, Especialista em Educação a Distância, Design Educacional, Licenciado em Letras.

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