AASP logo
AASP logo

Notícias

Direito de Família: desafios e possibilidades atuais

“O lar se tornou um ambiente simultâneo de trabalho, de educação domiciliar e da natural convivência entre as pessoas que ali residem. A sobreposição de todos estes papéis passou a exercer uma maior pressão sobre a estrutura familiar”, Viviane Girardi.

Celebramos hoje, 15/5, o Dia Internacional da Família. O distanciamento social tem provocado mudanças de hábitos e costumes no mundo inteiro, um deles está relacionado ao convívio familiar: pais, mães e filhos, que antes realizavam atividades com rotinas definidas, agora buscam adaptações para uma ininterrupta convivência diária.

Mas o que essa proximidade da quarentena pode estar ocasionando à família? Mais do que isso, qual o papel do Direito e do profissional que atua na área de Família?

Confira a seguir o bate-papo com a nossa presidente e advogada, a especialista Viviane Girardi, acerca do assunto:

Como você avalia a família brasileira atualmente?

A primeira característica da família brasileira é que ela não tem um modelo único de formação. Ela é plural. Nós temos as famílias formadas por casais heterossexuais, do mesmo sexo; casamentos, uniões estáveis; famílias monoparentais (formada por filhos e um dos pais); sem filhos, apenas o casal; famílias expandidas, que são aquelas em que temos pai, mãe, filhos e também avós, por vezes tios e sobrinhos morando juntos; e nós também temos aquelas famílias que chamamos de reconstituídas, oriundas do divórcio, em que por muitas vezes encontramos filhos provenientes das duas uniões anteriores de cada um dos pais que acabam por viver juntos, com ou sem irmãos em comum; ou seja, a família no Brasil apresenta vários formatos e o mais importante é que todas essas formas de família são reconhecidas pelo Direito.

O Direito de Família tem acompanhado os avanços sociais?

Podemos dizer que sim, principalmente após a Constituição de 1988. Muito fortemente pelo reconhecimento do Supremo Tribunal Federal (STF) quanto à liberdade das pessoas de escolherem o próprio modelo de constituição de familiar e também pela plena igualdade entre as modalidades de família. Com isso podemos afirmar que o Direito brasileiro acompanha as transformações sociais.

Acredita que o núcleo familiar sofreu abalos com a pandemia?

Sofreu. Sobre a família, a pressão ficou muito intensa por conta da sobreposição de vários papéis em um ambiente único. Quer dizer: o lar tornou-se um ambiente onde se tem trabalho, educação domiciliar e a natural convivência entre pessoas que ali residem. A sobreposição de todos estes papéis depositou uma pressão muito maior na estrutura familiar e em seus membros. Destaco a sobrecarga sobre as mulheres neste ambiente, muitas vezes com a falta de espaço privativo para realizar o trabalho; a dificuldade de se desvencilhar das tarefas, tanto virtuais como demandas domésticas, muitas delas com pouco ou até nenhum auxílio do parceiro. Outro problema que eu aponto neste período é a preocupante violência doméstica, seja a violência direcionada contra a mulher, muito acentuada nos últimos anos, sejam abusos cometidos contra as crianças. Uma convivência restrita ao ambiente familiar potencializa a posição do abuso do poder e de agressores. A pandemia evidenciou uma maior ausência de apoio a esse tipo de violência, deixando as vítimas mais expostas e vulneráveis a ela, sem uma rede pessoal de familiares, amigos ou escola, ou sem apoio de um órgão do Estado que não supriu este aporte. A diminuição de ampar foi considerável.

Em que aspectos o Direito de Família será diferente no cenário pós-pandemia?

Precisamos considerar dois fenômenos. Um deles é a solidariedade e a cooperação entre as pessoas dentro da família. Esta proximidade e o fato de as pessoas terem que se desdobrar em vários papéis e estarem nesta convivência mais intensa também revelou um lado colaborativo no cuidado doméstico, com os filhos, por exemplo, – o que pode não só  permanecer mas se intensificar no pós-pandemia. Por outro lado, a ausência dessa solidariedade, mencionada anteriormente, em um momento tão necessário fez com que se revelassem fraturas das relações que talvez levem a caminhos como separações e divórcios em função da convivência contínua.

A guarda compartilhada foi um dos pontos mais delicados no período de distanciamento?

No começo tivemos um momento de muito impacto no regime de convivência entre genitores e filhos. Muito por medo de contaminação no transporte das crianças e por estilos de vida diferentes. No primeiro momento, o impacto ocasionou, em alguns casos, até mesmo a supressão de direitos de convivência de maneira até desnecessária, porém ainda era um cenário de adaptação. Atualmente, com raras exceções e casos justificados, não parece ter fundamento a não convivência das crianças com os genitores, a não ser que um deles seja completamente descuidado, fora dos padrões, e que coloque as crianças em risco. Ainda que tenhamos mitigados um pouco esses direitos, não podemos suprimi-los.

Qual a mensagem que você poderia passar aos jovens advogados que iniciam no Direito de Família?

Primeiro, o estudo constante. Como todo ramo do Direito, não dá para termos a ilusão de que o Direito de Família é uma área mais fácil, que não exija dedicação e estudo. Porque ele se transforma muito rápido. O jovem precisa se manter constantemente atualizado. Segundo, que o Direito de Família é uma área em que se deve ter muito cuidado e sensibilidade para não impor sua visão da família para os seus clientes, aceitando a forma como aquele casal pretende conduzir as suas diferenças. Outra dica é que o advogado não se deixe ser instrumento de litígio, nem o fomente entre o casal e, muito menos, permita atos que impactem a vida das crianças. Há um compromisso ético muito claro na advocacia de evitar de todas as formas a alienação parental e os prejuízos aos vulneráveis.

Fonte: Núcleo de Comunicação AASP

Leia também: