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A Revisão da Tabela SUS: Entre a Suspensão do STJ e a Expectativa de uma Solução pelo Judiciário
Autor: Émerson Gabriel Honório
Data de produção: 10/9/2025
A sustentabilidade financeira de hospitais, clínicas e laboratórios que prestam serviços ao Sistema Único de Saúde (SUS) tem sido um dos temas mais prementes e debatidos no cenário jurídico atual. A raiz do problema reside na notória defasagem dos valores da Tabela de Procedimentos, Medicamentos, Órteses e Próteses e Materiais Especiais (Tabela SUS), que, em muitos casos, não cobre sequer os custos dos serviços prestados. Este cenário tem levado a um crescente número de ações judiciais que buscam o reequilíbrio econômico-financeiro dos contratos firmados com o Poder Público, gerando uma importante controvérsia que agora aguarda definição nos tribunais superiores.
O Cenário de Insustentabilidade e a Busca pelo Reequilíbrio
A prestação de serviços de saúde pela iniciativa privada em caráter complementar ao SUS é um pilar fundamental para a garantia do acesso à saúde no Brasil, conforme previsto no art. 199 da Constituição Federal. Contudo, a remuneração por esses serviços, atrelada a uma tabela de valores que não acompanha a inflação, os avanços tecnológicos e a complexidade crescente dos procedimentos médicos, tem criado uma situação de insustentabilidade para muitos prestadores.
Diante disso, a via judicial tem sido o caminho encontrado para buscar o reequilíbrio econômico-financeiro dos contratos administrativos, com base na teoria da imprevisão e na necessidade de manutenção da equação econômica originalmente pactuada. O argumento central é que a defasagem dos valores da Tabela SUS representa um desequilíbrio que onera excessivamente o contratado, violando princípios como a isonomia, a razoabilidade e a segurança jurídica.
O Impasse Atual: A Suspensão Nacional das Ações pelo STJ (Tema 1.305)
Apesar do precedente do STF, a questão do reequilíbrio econômico-financeiro dos contratos em geral (e não apenas os decorrentes de ordem judicial) continuou a gerar um grande volume de processos. Em resposta, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) afetou a matéria para julgamento sob o rito dos recursos repetitivos, cadastrada como Tema 1.305.
O STJ determinou a suspensão de todos os processos, individuais ou coletivos, que tramitam no território nacional e que discutem a possibilidade de equiparar os valores da Tabela SUS aos da Tabela TUNEP/IVR para preservar o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos. A controvérsia a ser decidida pelo STJ envolve três pontos principais:
1. A legitimidade passiva da União nas demandas;
2. A existência de litisconsórcio passivo necessário com Estados e Municípios;
3. A possibilidade de revisão da Tabela SUS para fins de reequilíbrio contratual.
Se por um lado a afetação do tema e a suspensão dos processos visam a uniformizar o entendimento e garantir a segurança jurídica, por outro, representam um duro golpe para os prestadores de saúde, que veem suas pretensões paralisadas, enquanto continuam a arcar com o ônus financeiro de uma tabela defasada. A suspensão, embora processualmente justificável, agrava a crise de sustentabilidade do setor, que não pode esperar indefinidamente por uma solução.
A Necessidade de Superação da Suspensão e a Atuação do Judiciário
A crítica à suspensão não reside no mérito do instituto do recurso repetitivo, mas na urgência que a matéria exige. A intervenção do Poder Judiciário, neste caso, não representa uma afronta ao princípio da separação dos poderes, como alega a Fazenda Pública em sua defesa. Pelo contrário, trata-se de um controle de legalidade e constitucionalidade de um ato administrativo (a tabela de remuneração) que, ao se mostrar desconectado da realidade econômica, compromete a execução de uma política pública essencial.
O próprio STF já se posicionou no sentido de que a omissão estatal na garantia de direitos fundamentais justifica a intervenção judicial, como no julgamento do AgR ARE 860979. A manutenção de uma remuneração insuficiente aos prestadores de saúde pode ser vista como uma forma de omissão que, em última análise, prejudica o próprio cidadão e o direito fundamental à saúde.
Conclusão: Perspectivas e a Importância da Preparação
A expectativa é que o STJ, ao julgar o Tema 1.305, siga a trilha já sinalizada pelo STF e reconheça o direito ao reequilíbrio econômico-financeiro dos contratos, estabelecendo critérios claros para a revisão dos valores. Uma decisão favorável não apenas fará justiça aos prestadores de serviços, mas também fortalecerá o sistema de saúde como um todo, garantindo a continuidade e a qualidade da assistência complementar ao SUS.
Para os gestores de hospitais, clínicas e laboratórios, o momento é de atenção e preparação. Embora as ações estejam suspensas, é fundamental que busquem assessoria jurídica especializada para:
● Analisar a viabilidade de futuras ações judiciais, preparando toda a documentação contábil e contratual que comprove o desequilíbrio financeiro.
● Acompanhar de perto o julgamento do Tema 1.305 no STJ, para que, uma vez liberados os processos, possam agir de forma rápida e estratégica.
● Avaliar a possibilidade de medidas alternativas e pleitos administrativos, com base na legislação vigente, incluindo a recente alteração na Lei 8.080/90 que prevê um reajuste anual.
A luta pela justa remuneração dos serviços prestados ao SUS é uma maratona, e a suspensão atual é apenas mais um obstáculo no percurso. A vitória, contudo, parece cada vez mais um horizonte possível, e estar bem assessorado é o passo decisivo para alcançá-la.
Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da AASP .
Émerson Gabriel Honório
Minibio: Advogado e Professor. Especialista em Direito Tributário e Terceiro Setor. Atua na consultoria e assessoria jurídica para entidades filantrópicas e empresas, combinando conhecimento técnico e didática para orientar clientes e alunos com excelência e clareza.