Medidas Judiciais Impetradas pela AASP
Colaboração do TJSP
MANDADO DE SEGURANÇA - Pretensão da impetrante de obter certidão do
arquivamento de representação contra Juiz de Direito. Atividade censória do
Tribunal de Justiça. Caráter sigiloso. Resguardo da independência e
dignidade do juiz. Inexistência de direito líquido e certo a ser amparado.
Denegação da ordem (TJSP - Órgão Especial; MS nº 98.285-0/1-SP; Rel. Des.
Paulo Franco; j. 18/12/2002; v.u.).
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Mandado de Segurança nº
98.285-0/1, da Comarca de São Paulo, em que é impetrante AASP - Associação dos
Advogados, sendo impetrado Corregedor Geral da Justiça do
Estado de São Paulo:
Acordam, em Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado de São
Paulo, por votação unânime, denegar a segurança.
RELATÓRIO
1 - Trata-se de Mandado de Segurança impetrado pela AASP - Associação dos Advogados contra ato do Exmo. Sr. Desembargador Corregedor Geral da Justiça que indeferiu pedido de certidão do inteiro teor da decisão proferida
no Processo G-35.977/02, de interesse de Juiz de Direito.
Funda-se, em suma, em que o ato impugnado viola direito líquido e certo da
impetrante, uma vez que a Constituição da República, no seu art. 5º, inciso
XXXIV, letra "b", assegura, como direito individual, "a obtenção de certidões
em repartições públicas para defesa de direitos e esclarecimentos de situações
de interesse pessoal", direito esse que não colide com o sigilo que resguarda
a atividade censória dos Tribunais, conforme já decidiu a Colenda Quinta Turma
do Egrégio Superior Tribunal de Justiça em venerando acórdão mencionado na
inicial (fls. 2 a 6).
Prestadas as informações (fls. 22 a 31), manifestou-se a Douta Procuradoria
Geral de Justiça pelo não acolhimento da impetração (fls. 34 a 43).
VOTO
2 - A AASP - Associação dos Advogados dera notícia ao DD.
Corregedor Geral da Justiça de fatos que teriam ocorrido no Fórum da Comarca
de ... , envolvendo Juiz de Direito (fls. 10 e 11).
Tomando conhecimento de que depois de prestadas informações pelo magistrado,
os autos do Processo G-35.977/02 foram arquivados (fls. 12), a ora impetrante
solicitou "certidão com inteiro teor da decisão proferida" (fls. 13).
Em resposta, a autoridade impetrada comunicou à impetrante "que o referido
pedido não poderá ser atendido, uma vez que o art. 316 do Regimento Interno
deste Tribunal de Justiça assegura o sigilo nas representações contra Juízes
de Direito" (fls. 14).
Esse ato, contra o qual se impetrou o presente mandado de segurança, é
incensurável.
Com efeito, o preceito constitucional a que se apega a impetrante somente
assegura a obtenção de certidões em repartições públicas "para defesa de
direitos e esclarecimentos de situações de interesse pessoal" (CR, art. 5º,
inciso XXXIV, letra "b").
No caso, não se verifica nenhuma dessas hipóteses, nem a impetrante, aliás,
cuidou de demonstrar, na inicial, que a certidão pleiteada se destine a defesa
de direito ou a esclarecimento de situação de interesse pessoal.
E cabe observar, como consigna THEOTONIO NEGRÃO (Código de Processo Civil e legislação processual em vigor, 30ª ed., Saraiva, p. 1.506, nota 30 ao art. 1º da Lei nº 1.533/51), que "em
mandado de segurança, não cabe a concessão com alteração da fundamentação de
direito que o embasar, sendo-lhe inaplicável o princípio
jura novit curia (RTJ 63/784, 85/314, 123/475; RJTJESP 43/157,
68/286, 107/73, 114/180)".
A Associação impetrante quer, portanto, obter a certidão apenas para ter
conhecimento do que se decidiu a respeito de sua representação, uma vez que
não mencionou qualquer outra finalidade.
Trata-se, contudo, de interesse que não é protegido juridicamente, uma vez que
conforme se enfatizou nas informações "o processo administrativo disciplinar
configura uma relação jurídica que polariza o ‘servidor’ de um lado e o Estado
de outro. Não há, nesse processo, participação do representante, cuja
atividade se exaure na comunicação do fato a ser investigado" (fls. 24).
De qualquer modo, esse interesse da impetrante, de natureza particular, não se
sobrepõe ao interesse público, consubstanciado nas normas que conferem sigilo
à atividade censória dos Tribunais, para "o resguardo devido à dignidade e à
independência do magistrado" (art. 40 da Lei Orgânica da Magistratura
Nacional; art. 316 do Regimento Interno do Egrégio Tribunal de Justiça de São
Paulo).
Assim, não se vislumbra direito líquido e certo que deva ser amparado neste
Mandado de Segurança.
Por tais motivos, e adotando-se ainda quanto se aduziu na manifestação da
Douta Procuradoria Geral de Justiça, denega-se a ordem impetrada.
Participaram do julgamento os Desembargadores Nigro Conceição (Presidente, sem
voto), Luís de Macedo, Viseu Júnior, Gentil Leite, Mohamed Amaro, Luiz
Tâmbara, Flávio Pinheiro, Gildo dos Santos (com declaração de voto), Vallim
Bellocchi, Sinésio de Souza, Jarbas Mazzoni, Theodoro Guimarães, Menezes
Gomes, Olavo Silveira, Barbosa Pereira, Ruy Camilo, Oliveira Ribeiro, Cezar
Peluso, Passos de Freitas, Ernani de Paiva e Marco César.
São Paulo, 18 de dezembro de 2002.
Sérgio Augusto Nigro Conceição
Presidente
Paulo Franco
Relator
VOTO VENCEDOR
1 - A impetração visa à obtenção de "certidão de inteiro teor da decisão
final" proferida no Processo G-35.977/02, referente à Representação que a
Impetrante ofereceu contra o ilustre Juiz de Direito Presidente do Tribunal do
Júri da Comarca de ... , que restou arquivada na douta Corregedoria Geral da
Justiça deste Egrégio Tribunal de Justiça.
2 - Sabe-se que a Impetrante não é parte no processo administrativo
disciplinar decorrente daquela Representação, que, em princípio, interessa
apenas ao Magistrado representado e ao Poder Judiciário.
3 - É certo que a Constituição Federal garante a publicidade dos julgamentos
realizados pelos órgãos do Poder Judiciário (art. 93, inciso IX, primeira
parte), mas, a própria Lei Orgânica da Magistratura dispõe que "A atividade
censória de Tribunais e Conselhos é exercida com o resguardo devido à
dignidade e à independência do magistrado" (art. 40), o que tem amparo na
própria Lei Maior, ao dispor que: "A lei só poderá restringir a publicidade
dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o
exigirem" (art. 5º, inciso LX).
4 - Esta Corte, em julgado de que foi Relator o eminente Desembargador Dirceu
de Mello, invocado nas Informações e também no Parecer da douta Procuradoria
Geral de Justiça, traz segura orientação a respeito, consubstanciada na
ementa: "Mandado de Segurança - Objetivo - Acesso a procedimento disciplinar
relativo a Magistrado - Inadmissibilidade - Apuração administrativa realizada
em caráter sigiloso - Norma do art. 40 da Lei Orgânica da Magistratura
Nacional, em perfeita consonância com o art. 5º, inciso XXXIII, da
Constituição da República - Incidência dos arts. 316 e 319 do Regimento
Interno do Tribunal de Justiça - Segurança denegada. A apuração administrativa
contra Magistrado, em nome do interesse público, faz-se em sigilo, visando a
manter incólume a dignidade da justiça" (JTJ 148/241).
Nessa trilha é também o entendimento do Egrégio Superior Tribunal de Justiça
(Recurso Especial nº 1.799-RJ, Rel. o eminente Min. Vicente Cernicchiaro,
in RSTJ 8/502, primeira parte da ementa).
É certo que, no julgamento do Mandado de Segurança nº 93.984-0/5, de São
Paulo, de que fui Relator sorteado fiquei vencido, porque ali o Representante,
como Impetrante, estava sujeito a processo penal (queixa-crime, por injúria e
difamação) movido pelo ilustre advogado da parte contrária, em razão de fatos
relacionados a episódio de uma audiência, que acabaram gerando a Representação
contra o Magistrado, depois arrolado como testemunha pelo querelante.
Daí, apoiado no direito de defesa a ser exercido, pelo querelado, naquela ação
penal privada, entendi que procedia o seu pleito, como impetrante, porque lhe
era assegurada "a obtenção de certidões em repartições públicas para defesa de
direitos e esclarecimentos de situações de interesse pessoal" (art. 5º, inciso
XXXIV, letra "b"), não sendo menos certo que "aos litigantes, em processo
judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o
contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes" (art.
5º, inciso LV).
Certamente por isso é que, em caso similar, o Egrégio Superior Tribunal de
Justiça assentou, em lapidar ementa, que: "Constitucional. Mandado de
Segurança. Direito à certidão. O direito de obter certidão é um direito
constitucional garantido a todos os cidadãos. Se se tratar de certidão
requerida pelo representante, de peça contida em processo disciplinar contra
magistrado, procedimento sigiloso por força de disposição da Lei Orgânica da
Magistratura, a certidão deve ser expedida com a ressalva de observar sua
finalidade e o sigilo da Lei Complementar nº 35/79, sob pena de
responsabilidade civil e criminal pela quebra do sigilo. Recurso parcialmente
provido" (RSTJ 19/290, Rel. o eminente Min. José de Jesus Filho,
acórdão proferido por maioria de votos nos autos do Recurso Ordinário em
Mandado de Segurança nº 552-RJ).
5 - No presente caso, porém, a situação é em tudo diversa.
A Associação impetrante, salta à vista, não busca "a defesa de direitos e
esclarecimentos de situações pessoais", como quer a Carta Magna, de modo que
não lhe pode ser deferida a pretendida certidão.
6 - Nessa conformidade, acompanhei o Voto do eminente Relator, Des. Paulo
Franco, e também deneguei a ordem.
Gildo dos Santos
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