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Lei nº 13.786/2018 ainda caminha sobre o terreno das incertezas

Lei trouxe novidade aos contratos de alienação de imóveis, delimitando os deveres de incorporadoras, loteadoras e adquirentes.

As recentes regras do distrato já fazem barulho no meio jurídico. A Lei nº 13.786/2018 disciplina os direitos e deveres de incorporadoras, adquirentes e loteadoras de imóveis nos casos de rescisão de contrato.

Sobre os aspectos da legislação, falamos com o desembargador Marco Aurélio Bezerra de Melo, que palestrou em março sobre as questões atinentes ao inadimplemento dos adquirentes durante evento realizado na Unidade Jardim Paulista da AASP. Acompanhe:

 

A polêmica Lei nº 13.786/2018

Trata-se de uma lei que lamentavelmente não teve um prévio debate entre os advogados e órgãos competentes. Ela contém várias atecnias jurídicas, por exemplo, a utilização vulgar de um termo técnico, que é o distrato; creio que também merecia uma vacacio legis maior para que a comunidade jurídica pudesse debater seus aspectos positivos e negativos.

Segurança jurídica para o mercado imobiliário

Sinceramente eu tenho minhas dúvidas se ela atingirá este fim, até porque a jurisprudência já tinha consolidado a maior parte dos entendimentos que a lei trouxe. Então, ela tem alguns pontos positivos, por exemplo, o de deixar claro que o incorporador tem o prazo de tolerância de 180 dias, por sua vez, o consumidor, que adquire ou propõe a aquisição de uma unidade autônoma, fora do estabelecimento comercial, tem direito ao arrependimento. Fixam-se percentuais de perdas máximos, mas que, ao meu modo de ver, colocam o consumidor em uma situação de excessiva desvantagem frente ao parceiro contratual e algumas questões que irão merecer o aprimoramento a partir dos debates da doutrina e da jurisprudência.

Divergências com o CDC

Se o adquirente se amoldar ao art. 2º da Lei n° 8.078/1990 (“Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final”), não tem como afastar o Código de Defesa do Consumidor (CDC). Isso não é porque eu quero, não é porque a lei nova quer, isso é o comando constitucional, que é a proteção do consumidor, é cláusula pétrea, garantia fundamental e princípio da ordem econômica no CDC. Agora, há alienações para pessoas que não se enquadram nesse perfil, que são pessoas que compraram para revender, para especular, que adquirem várias unidades e, nesse caso, a meu ver, não incide o CDC, incidindo puramente o Código Civil e a Lei n° 4.591/1964.

Judicialização

Sinceramente, por essa lei eu não acredito em diminuição da judicialização. Temos outros instrumentos que facilitam, como a mediação, instituto do qual sou um entusiasta. É uma questão sensível para a maioria dos brasileiros. A mediação vem de uma forma muito boa para diminuir processos judiciais, juntamente com as transações e a arbitragem. Agora a lei não vai, não. A judicialização ou continua ou aumenta.

Risco de enriquecimento ilícito

Quem enriquece ilicitamente é o ladrão e o corrupto. Agora, se você me pergunta sobre enriquecimento sem causa, penso que sim. É uma situação muito peculiar aquela em que a incorporação está submetida ao regime de afetação, a lei diz que a perda do consumidor inadimplente, cuja inadimplência pode surgir de um desemprego ou de uma doença, será de até 50% do que pagou. Mas não é só isso. Ele perde o que pagou de corretagem, as despesas contratuais e, se essa situação ocorrer no início do contrato, basicamente perde tudo. Se isso não for enriquecimento sem causa, terei que voltar aos bancos escolares. Se não é abusiva uma perda de metade daquilo que um vulnerável consumidor pagou, eu não estou entendendo mais nada. Creio eu que o Judiciário – com o trabalho, é claro, dos advogados – deverá colocar essa questão em um ambiente de equidade. Poderá ser até 50% em qual situação? Numa especulação, um empresário que adquiriu 50 salas em um negócio de risco, quem sabe? Agora, para o consumidor vulnerável… imagina: um imóvel em seu valor total, você paga metade disso, só de multa você perde 50%, pagam-se 5% de corretagem do valor do contrato, mais algumas despesas que foram feitas. Se está no início do contrato, o consumidor perde o imóvel, além de quase tudo que pagou. Não podemos esquecer que o Código chamado de defesa do consumidor existe para a tutela do vulnerável. Isso foi o constituinte que quis. Quem corre o risco no empreendimento é o fornecedor. A gente não quer enriquecimento sem causa para ninguém, mas não pode haver a lei do mais forte também.

Fonte: Núcleo de Comunicação AASP

 

 

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