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Caráter interpretativo do Direito Civil revela dilemas da sociedade

Capacidade civil e regime sucessório tiveram particularidades aprofundadas durante simpósio da AASP em São Carlos.

A legislação assegura que todas as pessoas tenham sua própria capacidade de direito, ou seja, o cidadão poderá desta fazer uso. Todavia, existem aqueles que por uma infinidade de situações são incapazes de praticar atos inerentes à vida, logo não exercem sua capacidade de fato.

Em simpósio realizado recentemente pela AASP, o promotor de justiça e mestre em Direito Civil, Oswaldo Peregrina Rodrigues, pediu aos profissionais do Direito que se debrucem sobre as entrelinhas da lei e citou o Estatuto da Pessoa com Deficiência como um modelo que peca na defesa total de vulneráveis.

Sancionada em 6 de julho de 2015, a Lei n° 13.146/2015 colocou em prática o Estatuto da Pessoa com Deficiência 180 dias após sua publicação, trazendo consideráveis avanços em defesa da dignidade da pessoa humana, mas que levantou questões para os institutos do Direito de Família, que incluem casamento, curatela e interdição, como se observa:

 

Art.6º A deficiência não afeta a plena capacidade civil da pessoa, inclusive para:

I – casar-se e constituir união estável;

II – exercer direitos sexuais e reprodutivos;

III – exercer o direito de decidir sobre o número de filhos e de ter acesso a informações adequadas sobre reprodução e planejamento familiar;

IV – conservar sua fertilidade, sendo vedada a esterilização compulsória;

V – exercer direito à família e à convivência familiar e comunitária;

VI – exercer o direito à guarda, à tutela, à curatela e à adoção, como adotante ou adotando, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas.

 

“A capacidade civil deve ser vista como o melhor dos paradigmas e interesses da pessoa com deficiência. Independentemente da natureza e grau de sua deficiência, temos o dever de aplicar princípios totais de cidadania, dignidade da pessoa humana, e principalmente garantir o princípio da igualdade”, afirma Peregrina.

Peregrina lembrou que a legislação quis a todo custo estabelecer o conceito da igualdade ao determinar que não há uma pessoa totalmente incapaz que seja maior de idade. Tal finalidade, porém, aboliu a ação de interdição absoluta do sistema civil. Desta forma, a busca da inclusão social fez com que pessoas com deficiência passassem a ser inteiramente capazes para o Direito Civil, o que, para o especialista, pode ser prejudicial à própria dignidade do aferido.

O professor cita o Código de Defesa do Consumidor como um exemplo do que pode acontecer quando não é realizada uma avaliação minuciosa das consequências geradas quando todos ficam do mesmo lado da balança.

“Por que o Código de Defesa do Consumidor foi editado? Porque o consumidor perante a empresa estava em uma situação de inferioridade. A legislação o desigualava. Tanto é que temos a inversão do ônus da prova. Ah, mas você está quebrando o princípio da igualdade. Exatamente! Justamente para que eu possa dar igualdade, na prática, a estas pessoas. Tudo isso porque eu tenho que pensar e analisar a situação pessoal dela”, conclui.

Quem é quem no Direito Sucessório?

Por sete votos a três, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu em maio deste ano que a união estável e o casamento possuem o mesmo peso jurídico dentro do Direito Sucessório. Desta forma o companheiro passa a ter os mesmos direitos que o cônjuge, tornando inconstitucional o art. 1.790 do Código Civil, que determinava regras específicas para a união estável.

A decisão, que teoricamente simplificaria o ato sucessório à luz da comprovação da união estável entre companheiro e falecido, tornou o assunto ainda mais polêmico, pois, segundo especialistas jurídicos, ela não define uma série de efeitos muito particulares da sucessão.

Durante exposição do painel de Direito Civil, o advogado Marcelo Truzzi Otero afirmou que, embora a decisão tenha colocado o companheiro no art. 1.829 ao lado do cônjuge, ela não fala expressamente se o companheiro é o herdeiro necessário.

“Além de não esclarecer o óbvio, ela também não diz se o direito a habitação do companheiro será aquele exercido pelo cônjuge no art. 1.831 ou se continua sendo do art. 7, parágrafo único, da lei n° 9.278 e outras questões pontuais como, por exemplo, o próprio direito sucessório da questão dos dois anos separado de fato que o art. 1.830 assegura ao cônjuge na literalidade da lei, que me parece contrária À própria essência da união estável, que, quando deixa de ter seus elementos essenciais a descaracteriza”, explica Truzzi.

O advogado defende que a doutrina se relacione com estas questões para um melhor entendimento dos advogados que atuam na área. “O STF terá de se pronunciar sobre estas questões para que exista uma uniformização do tema. Isso levará um certo tempo”, conclui o especialista.

Frases marcantes do painel sobre Direito Civil:

“Na ausência de proteção familiar ou de sua incapacidade, o MP deve agir em defesa dos direitos sociais da pessoa”, Oswaldo Peregrina Rodrigues.  #simpósioaasp

“O Estatuto da Pessoa com Deficiência não absorveu toda a capacidade civil”. Oswaldo Peregrina Rodrigues. #simpósioaasp

“O STF não definiu uma série de polêmicas do sistema sucessório que param sempre nos escritórios”, Marcelo Truzzi Otero. #simpósioaasp

“Como ter a exata dimensão do que ainda é namoro e a real intenção de constituição familiar?”, Marcelo Truzzi Otero. #simpósioaasp

Fonte: Núcleo de Comunicação AASP.

 

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