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Em busca de acesso aos tribunais superiores

A propósito de um notável procedente do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Por José Rogério Cruz e Tucci

Pressuposto elementar para que o advogado possa elaborar razões recursais de modo adequado e consistente é o de que a decisão impugnada contenha um mínimo de fundamentação.

Sob o ponto de vista técnico, a exposição dos motivos (ratio decidendi) importa permitir o controle crítico do ato decisório, para a exata determinação do conteúdo da vontade do juiz e, consequentemente, para a verificação dos limites do julgado.

A motivação revela, sob esse prisma, eventual falha cometida pelo magistrado. Constitui, por isso, relevante garantia de justiça, quando logra reproduzir fielmente, como num trabalho topográfico, o iter lógico que o juiz percorreu para encontrar o decisum, porquanto, se estiver equivocado, é possível aferir-se, nas razões, em que altura do percurso o seu autor se desgovernou.

Como é de observar-se, somente tendo ciência dos fundamentos do decidido é que o interessado poderá interpor recurso lastreando-o em argumentos sólidos. Assim também, nesse caso, o órgão adquem pode controlar com maior rigor a legalidade e a justiça dos atos decisórios submetidos a reexame.

Não é por outra razão que o vigente Código de Processo Civil contém original e importante regra no § 1º do art. 489, que arrola determinadas situações – frequentes, diga-se de passagem – nas quais aprópria lei se adianta, antevendo ofensa ao disposto no inciso II do referido dispositivo, que impõe a fundamentação como elemento essencial da estrutura da sentença.

Uma das situações mais gritantes da inobservância do princípio do dever de fundamentação, ainda que mínima, é diagnosticada, em regra, nas decisões monocráticas que negam trânsito aos recursos extraordinário e especial.

A despeito de ter havido considerável melhora nos dias atuais, é certo que, em passado não tão

remoto, o Tribunal de Justiça de São Paulo lastreava- se um modelo padronizado, que muito deixava a desejar, simplesmente porque o advogado não tinha qualquer parâmetro para elaborar as razões de agravo, a ser interposto contra a respectiva decisão denegatória. Como argumentar, diante de um ato decisório- padrão, o qual, a toda evidência, não enfrentou os argumentos da parte recorrente?

Daí a inquestionável relevância de recentíssimo acórdão da 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Agravo em Recurso Especial nº 1.404.216-SP, da relatoria do ministro Mauro Campbell, que conheceu do recurso de agravo, ao decidir que: “É possível notar empiricamente que o Eg. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo utiliza-se de modelo-padrão para o exercício da competência referente ao juízo de admissibilidade do recurso especial, aplicando indistintamente aos casos um mesmo texto decisório que, com o devido respeito, não examina as particularidades de cada caso concreto nem tampouco aplica o que de direito cada um deles precisa. Esse texto em grande medida resume-se a assertar a ‘falta de desrespeito à legislação enfocada’ e a aplicar a Súmula 07/STJ, o que inquestionavelmente nada resolve e impede, no comum dos casos, o regular exercício do direito de defesa pela parte que almeja recorrer, na medida em que dificulta a tessitura de razões para impugnar a generalidade dessa fundamentação. Isso ocorre, por certo, também no caso em concreto, de modo que observo ter minuta do agravo em recurso especial refutado, o tanto quanto possível, essa motivação etérea, daí por que me parece impositivo o seu conhecimento”.

Conclui-se, sem qualquer esforço, que este inusitado precedente bem revela a importância da exposição dos motivos do decisum para a correta aferição da procedência do inconformismo do recorrente!

José Rogério Cruz e Tucci é advogado e ex-presidente da AASP

O artigo foi publicado originalmente na edição nº 3085 – 2ª quinzena de junho de 2019, e é de responsabilidade do autor e não reflete necessariamente a posição da entidade.

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